segunda-feira, 31 de maio de 2021

REVISTA EXPRESSÃO (UNEB/DCH III)


 

Um olhar sobre a Revista Expressão, publicação do DCH III da Universidade do Estado da Bahia/Campus Juazeiro. Inscreva-se no canal! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

domingo, 30 de maio de 2021

Poemas estranhos e estrangeiros (Parte VIII - em Francês)


 

Por Germano Xavier

Tradução: Luísa Fresta


Domingo, 23 de maio de 2021

Poemas estranhos e estrangeiros (Parte VIII)

 

Des poèmes étranges et étrangers (Partie VIII)

 

Chez Hergé, à la recherche de Marx

 

il était encore tôt lorsque nous avons contourné le rond-point de l’Arc de Triomphe

pour dire au revoir à Paris. puis Saint-Denis, Charles de Gaulle,

la Picardie, la Champagne, les alentours d’Amiens, de Verne, la A1, la E19,

et même une pause prévue à l’Atomium.

 

Bruxelles m’a accueilli toute fleurie et assez discrètement.

la cathédrale Saints-Michel-et-Gudule acclimatait la paix

de mes tous premiers pas sur le sol belge.

là-bas, aux alentours de la rue d’Arenberg, j’ai avancé

vers les Galeries Royales Saint-Hubert.

 

par moments je me suis arrêté pour admirer une jeune fille qui chantait merveilleusement

on dirait une chanson d’auteur. le son de l’harmonica me séduit toujours.

j’ai traversé en diagonale jusqu’à la rue de la Colline. Tintin, d’Hergé

se trouvait là-bas et je lui ai tenu compagnie pendant quelque temps.

 

je marchais parmi la foule et du coup je vois

l’époustouflante Grand-Place, considérée, par certains spécialistes voyageurs, la plus belle place d’Europe, voire du monde. après avoir tourné un peu

pour tout appréhender en profondeur, j’ai regardé attentivement la Maison du Cigne. Selon la légende

c’est justement à cet endroit, un modeste établissement, que Marx et Engels ont conçu et écrit le Manifeste du Parti Communiste.

être là-bas était donc quelque chose d’inénarrable, pour maintes raisons. on finit par

se sentir un peu imprégné par cet aura historique. par le simple fait de respirer tout près de la mémoire de ces événements.

 

je ressentais une joie nouvelle et inconnue.

j’ai réfléchit sur toutes les réunions ouvrières, de lutte

et de résistance. la poésie du socialisme imprégnait l’atmosphère parmi

tous les récits que l’on pouvait y témoigner sans faire d’effort.

 

après cet émerveillement naturel,

j’ai touché la statue Éverard  t’Serclaes, j’ai gouté une des fameuses gourmandises belges et juste à coté de Manneken Pis j’ai enfin sourit, des sourires de liberté.

 

l’après-midi s’avérait une destinée pleine de guildes.

je me suis accoudé aux murs de l’immense Hôtel de Ville

et alors, tout simplement, j’ai pris une photo du Temps.

 

 

(Matin du 14 juin 2017)





terça-feira, 25 de maio de 2021

CAPRICHOS & RELAXOS, de Paulo Leminski


 

Poesia marginal, espacial, concreta e tudo o que você quiser que. Inscreva-se no canal! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

O cavalo mítico de Sylvia Plath


Por Germano Xavier

Sylvia abre sua pasta negra – o livro Ariel - com um poema escrito para sua filha Fiedra, intitulado “Canção da Manhã”. Logo de cara, a poeta escreve: “O amor faz você funcionar como redondo relógio de ouro”. Esta é a primeira frase do poema de abertura de seu último livro. Abre-se com ele um leque de verdades possíveis onde o elemento a se abanar é próprio de uma atmosfera esperançosa. Alguém nasceu, ou melhor, algo está para nascer, ou germinou. Uma vontade de bem brota no momento de abertura da palavra que estava até então fechada em si mesma. O chegar do algo novo muda a rotina do eu-lírico, colocando em seus olhos o apuro acerca dos agora novos e simples eventos. Na hora do choro da criança nascida, o som reacende a voz adormecida no escuro da normalidade, tecendo assim uma nova manhã.

Poucos foram aqueles que conseguiram domar o seu cavalo palávrico com tamanha destreza dentro dos campos da literatura, e principalmente da poesia, como fez Sylvia Plath, poeta natural de Boston, estado de Massachusetts, Estados Unidos. O seu cavalo poético Ariel, livro póstumo publicado no ano de 1963 – comparável ao “Espírito do ar” da peça shakesperiana A Tempestade -, mesmo com a excelência de sua monta, receoso escapou de seus plenos domínios e fugiu com outra montaria. Ariel, que em hebraico designa o “leão de Deus”, foi deixado escrito sobre a cabeceira de sua cama antes de Sylvia cometer suicídio em 11 de fevereiro de 1963, na ocasião com apenas 30 anos de idade.

Após analisar o conteúdo da pasta, Ted Hughes, marido de Plath, assustado com o acentuado teor intimista dos poemas, que revelavam momentos conturbados vividos pelo casal, eliminou treze poemas da sequência organizada por Sylvia quando do seu lançamento mundial, ocorrido em 1965. O Ariel original, segundo a crítica literária mundial, possuía uma atmosfera completamente destoante do Ariel alterado por Hughes, este potencializando características que evidenciariam o possível tino suicida da esposa, o que, por conseguinte, o livraria de qualquer culpa primária a ele destinada.

Plath, mesclando técnica e emoção, escreve uma das sequências poéticas mais instigantes da literatura da segunda metade do século XX. A organização dos poemas em seu Ariel elevou-a ao patamar dos clássicos e a colocou ao lado de poetas confessionais do prestígio de Anne Sexton e Robert Lowell, entre outros. O livro ajudou a elevar também sua imagem enquanto ícone feminista, por ter sido ela um retrato de combate contra as agruras e desmandos sentimentais praticados por seu marido. A poeta escreveu Ariel justamente no último ano em que viveria, simbolizando que era uma escritora extremamente dependente do exercício da palavra para a manutenção de sua sobrevivência. Inaugurava-se assim uma parcela importantíssima da mitologia da dor humana a partir da verve plathiana.

Em breve, uma análise (leitura) de todos os poemas do livro Ariel. Fique de olho!

segunda-feira, 24 de maio de 2021

A ESCOLA DAS FACAS, de João Cabral de Melo Neto


 

Um depoimento sobre uma transformação pessoal a partir da poesia deste grande mestre. Inscreva-se no canal! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

domingo, 23 de maio de 2021

Poemas estranhos e estrangeiros (Parte VIII)


 

Por Germano Xavier


Em terras de Hergé, mas em busca de Marx


ainda era cedo quando pegamos a giratória do Arco do Triunfo

para um último aceno a Paris. logo Saint-Denis, o Charles de Gaulle,

a Picardia, Champagne, as proximidades da Amiens de Verne, A1, E19,

até um pouso calculado no Atomium.


Bruxelas me recebeu com flores e bastante discrição.

a catedral de São Michel e Santa Gúdula aclimatava a paz 

dos meus primeiros passos em solo belga.

ali, nas imediações da Rue d'Arenberg, dobrei e investi passos

por dentro das Galerias Reais Saint-Hubert.


parei por um instante para prestigiar uma moça que cantava lindamente

o que parecia ser uma canção autoral. o som da gaita me cativa.

peguei em diagonal até à Rue de la Colline. Tintin de Hergé 

ali poderia ser encontrado e um tempo fiquei.


enfiado por entre as gentes, me fiz andar e logo se abriu para mim

a estonteante Grand Place, considerada por alguns especialistas viajantes 

a praça mais bonita da Europa e, quiçá, do mundo. depois de vários rodopios 

nas vistas, fixei no Le Cygne. reza a lenda que foi dentro daquele modesto estabelecimento

que Marx e Engels pensaram e escreveram o Manifesto do Partido Comunista.

estar ali, por tudo, era incrível. a gente acaba sentindo um pouco

daquela aura histórica só de respirar nas proximidades dos fatos

e dos sentidos.


havia uma felicidade diferente em mim.

imaginei toda uma memória de reuniões proletárias e de luta 

e de enfrentamento. a poesia do socialismo pairava no ar em meio 

a tantas narrativas inversas presenciáveis sem nenhum esforço.


após aquele meu natural deslumbre,

toquei a estátua Everard 'T Serclaes, experimentei uma das famosas guloseimas

belgas e ao lado do Manneken Pis sorri sorrisos de liberdade.


a tarde era um destino repleto de guildas.

encostei minhas costas nas paredes do imenso Hotel de Ville 

e simplesmente fotografei o Tempo.


(Manhã de 14 de junho de 2017)


segunda-feira, 17 de maio de 2021

CARTAS DE UM DIABO A SEU APRENDIZ, de C. S. Lewis


 

Um livro para pensar o mundo pós-quarentena (COVID-19). Inscreva-se no canal! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

domingo, 16 de maio de 2021

Poemas estranhos e estrangeiros (Parte VII - em Francês)


 

Por Germano Xavier

Tradução: Luísa Fresta


Quinta-feira, 6 de maio de 2021

Poemas estranhos e estrangeiros (Parte VII)

 

Des poèmes étranges et étrangers (Partie VII)

 

Un visage de Paris

 

l’aristocratique zone de Versailles appartenait déjà au passé, lorsque,

sans trop réfléchir, j’ai décidé de connaître l’Opéra National de Paris.

le bâtiment était bien là, un monument éloquent

et éclatant. Les Galeries Lafayette se trouvaient très près de là :il s’agit d’un magasin à plusieurs rayons

dans la capitale française, rien de plus.

 

après avoir sondé les alentours je me suis arrêté pour un petit café et pour regarder des cartes ;

je suis entré dans le tunnel du métro vers Montmartre.

là-bas, à travers des stations de surface et souterraines j’ai vu Stalingrad, Paris m’a semblée

pleine d’immigrés avec leurs vêtements typiques, leurs faims

de quoi que ce soit, très visibles à mes yeux, avec des rues et des adresses

plus simples, plus claires, beaucoup plus douloureuses

et pleines de flammes.

pendant un certain temps j’ai regardé amoureusement la façade du Moulin Rouge jusqu’au moment de prendre le funiculaire

jusqu’à la basilique du Sacré-Cœur, symbole maximal du quartier bohémien.

j’ai pris les ruelles dans le sens ascendant avec le cœur plein de joie.

 

Paris n’était pas que des évidences,

elle sentait l’humanité et touts les mystères de l’art vivant.

c’était là-bas, au rythme du temps fugace, que j’ai senti la douloureuse nostalgie des heures qui passaient, lors de mon départ. tout ce temps perdu loin de Montmartre !, ai-je alors pensé.

 

le temps filait rapidement et j’ai pris à nouveau le métro vers les marges de la Seine.

là-bas, par un chanceux hasard, j’ai réussi à prendre le dernier train A14 vers La Défense.

le ciel clair était encore loin et je me suis accoudé au Grand Arc.

j’ai pris un goûter rapide pendant que j’observais la danse exaltée d’un homme noir

juste au centre de la grande cour de miroirs.

il tenait dans ses mains une bouteille de vin et toutes ses craintes. je garderai cette image dans ma mémoire

 

sûrement.

 

j’ai regardé sur les cotés et ensuite vers le ciel, proche de l’horizon.

je n’avais plus de cartes dans mon portable qui d’ailleurs était déchargé

n’ayant pas le choix, il me fallait absolument sortir de là en demandant le chemin de l’hôtel.

le gardien le plus proche ne me comprenait pas (soit il ne faisait aucun effort).

 

un Français du coin, qui habitait proche de l’hôtel,

a écouté la conversation et m’a proposé de m’aider. c’était donc lui mon guide pendant environ trente minutes,

parmi des bâtiments, des supermarchés et des raccourcis que seul un habitant de la zone pourrait connaitre avec tant d’adresse.

 

c’était Paris qui prenait congé de moi d’une manière assez singulière.

 

il me restait juste un brin de temps pour un demi à l’intérieur d’une dernière pensée.

Paris, c’est vraiment la fête, ai-je murmuré.

 

 

(Paris, dans l’après-midi et la soirée du 13 juin 2017)


segunda-feira, 10 de maio de 2021

Clube de Carteado, de Germano Xavier


 

O autor falando de seu próprio livro? Ah, isso não vai prestar. Inscreva-se no canal e acesse minhas redes sociais! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

sábado, 8 de maio de 2021

Novo livro de Luísa Fresta será lançado em Portugal


 Lançamento: 7 de Junho/2021

As narrativas que constam desta antologia pessoal são desiguais no estilo, no ritmo e na temática. Aqui se fala de amor, do quotidiano, do elemento insólito nas coisas triviais, da hipocrisia social, de mulheres, do envelhecimento e da miséria urbana. Dos laços familiares e da maneira como edificamos sociedades e permutamos valores, cuja prioridade e relevância está permanentemente a ser questionada. Lisboa ou Luanda estão implícitas, tal como a noção de urbe e de movimento. São vinte e seis contos onde pontualmente se registam pensamentos como monólogos inaudíveis exteriormente: temas que, como a saúde mental, encontram também o seu lugar nestas páginas.



Sintam-se convidad@s!

BOLSONARO NÃO É PRECISO, de Germano Xavier


 

Em apoio à democracia, outro parafraseio pessoano contra o retrocesso no Brasil. Inscreva-se no canal! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

quinta-feira, 6 de maio de 2021

Poemas estranhos e estrangeiros (Parte VII)


 

Por Germano Xavier


Uma Paris 


o palaciano setor de Versalhes já havia ficado no passado quando, 

sem muito pensar, decidi conhecer a Ópera Nacional de Paris. 

o prédio estava lá, um monumento eloquente 

e repleto de brilho. Galeries Lafayette bem ali 

nas proximidades: uma loja de departamentos 

na capital francesa, nada mais.


após sondar as redondezas e uma parada para café com conferência em mapas,

entrei no túnel do metrô sentido Montmartre.

ali, via estações elevadas e subterrâneas Stalingrad, Paris

me surgiu repleta de imigrantes, com suas vestimentas típicas, com suas fomes

de quaisquer coisas bem mais visíveis aos olhos, com suas ruas e moradas

mais simples e bem mais dia e bem mais dor e bem mais fogo.


namorei por um tempo a fachada do Moulin Rouge até pegar o trenzinho 

até a Basílica do Sagrado Coração, símbolo máximo do boêmio bairro.

subi as ruelas com o coração alegre. 


Paris não era apenas o óbvio, 

tinha cheiro de humanidade e todos os mistérios de arte viva.

foi ali, no entrepasso do escasso tempo, que ao ter de partir senti o mal

maior das horas passantes. quanto tempo se perde em Paris

longe de Montmartre!, pensei.


a hora avançava rápido e entrei em um metrô para as margens do Sena, novamente.

de lá, por sorte tomei o último trem A14 para La Défense. 

o céu claro inda era ao longe e me encostei no Grande Arco. 

fiz um rápido lanche e observei a dança sem ajustes de um negro

bem no meio daquele grande pátio de espelhos.

ele segurava uma garrafa de vinho e todos os seus medos

em suas mãos. aquela cena ficará, 


ficará.


olhei para os lados e depois para o céu beirando a linha do horizonte.

eu não tinha mais mapas nem carga no aparelho celular 

e o único jeito era sair perguntando qual o caminho 

para o hotel. o guarda mais próximo não entendia (ou não queria).


um francês local, que morava próximo ao hotel,

escutou a conversa e se prontificou a ajudar. foi ele o guia por cerca de 30 minutos,

entre prédios, supermercados e desvios que só um morador da localidade

saberia executar com tamanha destreza. 


era Paris se despedindo de meus olhos de um jeito muito inusitado.


restou um fiapo de tempo para um chope dentro de um último pensamento.

Paris é mesmo uma festa, balbuciei.


(Paris, tarde e noite de 13 de junho de 2017)



domingo, 2 de maio de 2021

Poema CONTRANARCISO, de Paulo Leminski


 

Um poema de Leminski para uma reflexão humanitária. Inscreva-se no canal e acesse minhas redes sociais! YOUTUBE: http://youtube.com/oequadordascoisas BLOG: http://oequadordascoisas.blogspot.com FACE: https://www.facebook.com/germanovianaxavier INSTA: https://www.instagram.com/germanovianaxavier ISSUU: https://issuu.com/art_brazil LATTES: http://lattes.cnpq.br/8697294516715015

Ana C., aos seus próprios pés



 Por Germano Xavier

Mulher alterada em muitos sentidos, estigmatizada e polida com diversos títulos e "encaixes tribais" - como por exemplo o de escritora "marginal" -, Ana Cristina Cesar ou simplesmente Ana C., como era mais conhecida, tinha tudo para não ser quem foi (alguns até acreditam no inverso, como eu). Mulher nascida em berço de ouro no Rio de Janeiro, ou quase de ouro, filha de pais protestantes e investida numa parcela da sociedade por demais jocosa e mesquinha, Ana C. tão logo cresceu foi adentrando na ciranda de pedra escondida por detrás da literatura. Sempre reclusa, fechada em cenhos, foi com esse instrumento nas mãos que Ana C. escreveria a sua curta e marcante história de vida.

Em seu livro A teus pés, originalmente publicado ainda antes de sua morte, Ana C. demonstra, sem deixar brechas no que tange a possíveis confundimentos, o quanto estava distante de toda estirpe de rotulagem literária em voga no seu tempo. É óbvio a aceitação da ideia de que ela bebeu do Tropicalismo, do modo de escrita "marginal" - diferente - de uma penca de escritores que estavam conquistando espaço no cenário das letras no Brasil, a tomar como exemplo Paulo Leminski, o Polaco, assim como de outros escritores que muito a influenciaram, como Katherine Mansfield, Clarice Lispector e T.S.Eliot, como também é evidente que a literatura produzida por essa carioca que veio ao mundo no ano de 1952 não se restringe a esses fatores simplesmente.

A teus pés, livro que a consagra, diz de maneira nada morna a que se destinavam os versos tortos de Ana Cristina Cesar. Breves, intensos, intimistas, autobiográficos e com uma aura misteriosa sobre o corpo e o não-corpo de cada poema, é com conforto que se pode dizer que ela tracejou sua letra como quem adornava o fazer de uma literatura perene, que não iria morrer instantaneamente às vistas de uma primária decaída. A primeira impressão que é transportada ao leitor é a de que há uma escritora lutando consigo mesma, num duelo que não tem um fim estipulável mesmo quando as páginas findam, numa batalha que atravessa todo o tempo de escrita hipnotizando-nos por meio de uma sedução estética disforme e ímpar.

A obra, que é aberta com uma belíssima coleção de fotografias e com prefácio de Armando Freitas Filho, entoa um canto que parece se autorequerer e se autodenominar forte e destemido. Mesmo na falta de algo, a sugestão para a completude ou para o seu desejo é presente: "Eu tenho uma idéia./Eu não tenho a menor idéia./Uma frase em cada linha. Um golpe de exercício.", diz no poema inicial, primeiro dentre muitos que não recebem título, o que dá ao conjunto textual um aspecto de interligações tanto no fator linguístico quanto no discursivo. Mulher transitiva, transitória, feita de transes, pouquíssimo apegada ao que quer que fosse, Ana C. começa a destilar um emaranhado de confissões que chegam aos olhos de quem lê como verdades absolutas.

A linha limítrofe entre a poeta e a mulher sofre um desgaste importante na medida em que a leitura é realizada. "Muito sentimental./Agora pouco sentimental.", diz, revelando-se, sem querer se revelar. Acreditar ou não, tudo isso é uma outra história. No poema Inverno Europeu, escreve prosaicamente: "Não sou personagem do seu livro e nem que você queira não me recorta no horizonte teórico da década passada.", ou ainda em Marfim: "As aparências desenganam. Estou desenganada. Não reconheço você, que é tão quieta, nessa história. (...) Palavra que não mexe mais no barril de pólvora plantado sobre a torre de marfim." Nesta sua intempestuosidade, Ana C. continua se dissecando, como se num esforço de autoconhecimento: "Te apresento a mulher mais discreta do mundo: essa que não tem nenhum segredo", excerto do poema Noite Carioca.

O processo confessional que se dá em A teus pés é tão genialmente cerzido que, mesmo quando toda a confissão parece óbvia e reticente, a dúvida vigora como única percepção plausível. Quando diz "Sou fiel aos acontecimentos biográficos" e "Não imito a minha nostalgia", ou em "É daqui que eu tiro versos, desta festa - com arbítrio silencioso e origem que não confesso...", a escritora acaba se resguardando ainda mais, como quem espertamente se utiliza de uma bruma para escapar de alguma possível afetação. Surge então a imagem de uma mulher na contramão de tudo, principalmente de seu entendimento. Reluz cintilante a pessoa que é capaz de driblar a sua própria fé, de amar estranhamente, que possui em mãos a cartilha para todas as curas.

Não obstante, Ana Cristina desliga-se de tudo: "Eu não estava nem aí. (...) Duvido muito." Nesse ínterim, reforça ainda mais seu teor de rebeldia: "Não olho para trás e sai da frente que essa é uma rasante. Garras afiadas, e pernalta.", como escreve no poema Atrás dos olhos das meninas sérias. Ana é talvez feita do ingrediente do "Tesão do talvez.", que engole "... desaforos mas com sinceridade.", que "Só e sempre procura essas frases soltas no seu livro que conta a história que não pode ser contada.", verso do poema Duas Antigas I. Mulher que fez "misérias nos caminhos do conhecer.", que hoje livra os outros da verdade e que escreve "coisas assim,/para pessoas que nem sei mais/quem são,/de uma doçura/venenosa/de tão funda".

A teus pés é um livro escrito por uma poeta que em 29 de outubro de 1983 pulou do prédio onde seus pais Waldo Aranha e Maria Luiza moravam, escrevendo de uma vez por todas seu poema mais revelador: o suicídio. Ana morreria ali, nascendo como uma rosa que não consegue esconder a beleza de suas íntimas desgraças, e que tampouco refuta diante do instante de se desbravar o desconhecido. Porque assim havia de ser, como bem ela avisou em um de seus poemas em prosa: "Às vezes me despeço com brutalidade. Chego a parecer ingrata." Talvez fosse tudo o que ela quisesse dizer naquele momento. E que disse. Ou apenas escondera as palavras sob o capacho na entrada de uma casa qualquer, labirinto-mundo.