segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Sobre a grávida gravidade da vida (Parte II)



Por Daniela Correia e Germano Xavier


Episódio de hoje: Rilke, desequilíbrio, autossabotagem e reconhecimento


Há um vício constante no mundo moderno: o de se autossabotar – termo usado para definir a criação de obstáculos os mais diversos, e que, tendo como alvos o consciente e/ou o inconsciente, busca atrapalhar a realização dos nossos maiores sonhos, de nossas metas e objetivos. Desejos estes que, por motivos vários, as pessoas sentem ou têm insegurança em vivê-los. A procrastinação é um dos piores comportamentos de autossabotagem. Transferir um projeto para um futuro próximo, sem qualquer data definida, é quase sempre o resultado de não se efetivar nada.

Não é sempre que a consciência está crente do nosso comportamento autossabotador, das nossas atitudes, tampouco de nossas frustações. Faz-se necessário ou se requer reconhecimento, de moldagem múltipla, para que seja perceptível o nosso desenvolvimento pessoal e humano. Configura-se, portanto, tal qual uma batalha constante, diária, recorrente, combatida por meio de uma enorme coragem, um enorme condicionamento mental e, sobretudo, humildade para se reconhecer as falhas.

Todos estão aptos a se declararem incapazes. É comum. Infelizmente esta decisão é exigida pelo nosso ambiente social, já que todo indivíduo é testado e cobrado excessivamente, e tão logo acaba decidindo não tentar para assim evitar frustações de um possível fracasso. Com isso, tal prática torna-se um vício, com vários dilemas em mente, do tipo “eu não posso”, “eu não consigo” ou “amanhã eu tento”.

O poeta alemão Rainer Maria Rilke, quando respondeu a Franz Xaver Kappus (as 10 cartas de Rilke ao jovem podem ser lidas no clássico Cartas a um jovem poeta), não viu nas cartas enviadas a ele os porquês literários de um aspirante a poeta/escritor, mas percebeu que, antes de mais nada, seria necessário erguer a alma daquele jovem para que ele se sentisse forte e apto o suficiente para ir adiante em seus sonhos. Fugindo aos questionamentos quase óbvios do garoto, Rilke se desvia da mera crítica e acaba fomentando um pequeno postulado sobre a vida, sobre a coragem, sobre o autoconhecimento e, por conseguinte, um curto tratado contra todas as formas de autossabotagem.

Vale enfatizar que cada um tem o seu devido valor e, assim sendo, pode acrescentar muito para si e também para os outros. Nossas diferenças são nossas riquezas. Cada ser humano pode ser totalmente suficiente para si mesmo. No entanto, leitura e/ou escuta de apenas uma frase de autoajuda não basta. E não é besteira não admitir o quão difícil é, sentir-se inábil e querer se isolar. Com ajuda e acolhimento é possível superar. Acredite.


* Imagem: https://www.deviantart.com/carmineflame/art/Portrait-288558015