domingo, 28 de dezembro de 2014

Nada muito sobre filmes (Parte XI)

*
Por Germano Xavier


ELEFANTE BRANCO

Bucaneiros e bucaneiras, é o seguinte: ainda estou por ver um filme ruim com o Ricardo Darín no elenco. O moço só sabe estrelar filmaços. ELEFANTE BRANCO (2012), dirigido por Pablo Trapero, é um exemplo vivo do que estou a falar. O drama mescla religião, miséria, política e jogos de poder, tendo como pano de fundo uma favela da capital argentina que dia após dia se vê à mercê dos desmandos de toda uma ordem formada. O início é lento e monótono, mas em sua segunda hora consegue se superar. Para ver e rever com calma. Recomendo a todos os mortais!

IRMÃ DULCE

Bucaneiros e bucaneiras, eu estou profundamente encantado com o filme IRMÃ DULCE (2013), dirigido por Vicente Amorim. Uma cinebiografia digna de toda a história que perpassa este mito baiano-mundial da bondade e da caridade. Para quem não conhece o legado do "Anjo Bom da Bahia", como ficou conhecida, favor assistir ao filme o quanto antes para melhor se inteirar. Vocês entrarão em contato com uma emocionante lição de amor para com os mais pobres e desassistidos. Em tempos de hedonismos e de crueldades as mais variadas, o filme nos serve como um soco no estômago e nos deixa sem ar do começo ao fim. Grande atuação de Bianca Comparato. Recomendo a todos os mortais!

BOA SORTE

Fui ao cinema assistir ao tão falado e pouco visto BOA SORTE (2014), filme dirigido por Carolina Jabor. Cria-se uma expectativa enorme no começo do filme, mas infelizmente a trama, que termina sendo mais uma historieta de amor proibido, não consegue se sustentar e faz de seus parcos 90 minutos mais longos que o esperado. Não deu para sentir quase nada. O pano de fundo é o quesito das internações psiquiátricas, mas fica lá no fundo mesmo. Sem mais delongas, há muita coisa melhor por aí. Sigamos, bucaneiros!

O HOBBIT - A BATALHA DOS CINCO EXÉRCITOS

Hoje tive a oportunidade de assistir ao último capítulo da trilogia O HOBBIT, de subtítulo A BATALHA DOS CINCO EXÉRCITOS (2014), dirigido por Peter Jackson. Em 3D, a experiência foi incrível. Um ano de espera e o filme que conta o maior feito de Bilbo Bolseiro na Terra Média, quando longe do Condado, fecha com maestria toda uma saga que, na verdade, inicia-se bem antes de O Hobbit e termina com a trilogia O Senhor dos Anéis, todos baseados nos livros de J.R.R.Tolkien. Quem conhece a obra de Tolkien, sabe do que estou falando. Eu sou fã de carteirinha de toda essa mitologia literária. Por isso, recomendo a todos os mortais!

O CORVO

O CORVO (1994), dirigido por Alex Proyas, é um filme apenas razoável. Há muito mitificado pelo fato de o ator principal do elenco, Brandon Lee, ter falecido em cena, quando visto hoje o longa não causa mais tanto espanto assim. Possui toques mórbidos a la Edgar Alan Poe e a trama ocorre numa atmosfera bastante caótica. Influência enorme dos quadrinhos. Vale uma olhadela!

LUÍSES - SOLREALISMO MARANHENSE

O filme LUÍSES - SOLREALISMO MARANHENSE (2013), dirigido por Lucian Rosa, é parte-manifesto do movimento Solrealista, gerado na capital do Maranhão pelas mãos de artistas e cidadãos em geral, que mescla ativismo cultural e engajamento político. Tomando como ponto de partida a lenda da serpente adormecida que vive nas profundezas da cidade-ilha, o longa escancara a real face da cidade e de seu povo, (des)governado há mais de 40 anos pelos Sarney. Para mim, que fui tentar a vida em São Luís no ano de 2011 e que praticamente só tive a oportunidade de conhecer a face "nobre" da Ilha do Amor, o filme revelou-se bastante esclarecedor. Há pitadas de Glauber Rocha. Recomendo a todos os mortais!

PARA ROMA COM AMOR

Mais um filmezinho do Woody Allen que consegui ver recentemente. PARA ROMA COM AMOR (2012) diverte e ao mesmo critica inteligentemente a efemeridade das coisas mundanas e, também, das relações humanas. Filme construído em cima de historietas que se mesclam, cada uma com suas terminações insuspeitadas. Típico filme dirigido por Allen, com muitos diálogos e verossimilhança incrível. Merece nosso tempo na tela. Recomendo a todos os mortais!


* Imagem: Google.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Poemas de Germano Xavier em Francês (Parte IV)

*
Por Germano Xavier

"tradução livre"


sábado 06/12/14
A piscina

La piscine

tu entres
délicatement
dans l’eau

(il y a en cela une redondance voulue)

le cœur aquatique
floral, humide
sous le maillot

ce n’est ni toi
ni le tissu
c’est le bleu qui se mouille


* Imagem retirada do Google.

sábado, 6 de dezembro de 2014

A piscina

*
Por Germano Xavier

você entra
delicadamente dentro
d'água

(há redundância proposital)

coração aquático
em floral úmido
sob o maiô

não é você
nem a malha
é o azul que se molha


Imagem retirada do site Deviantart.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Poemas de Germano Xavier em Francês (Parte III)

*
Por Germano Xavier

"tradução livre"


domingo 30/11/14
Emboscada no coração do amanhã

Une embuscade en plein cœur du devenir

j’ai visité des labyrinthes
au moment où tu as accosté à ce fort

(au milieu du jardin bleu
je ne voyais que les mâts
des navires dans tes yeux)

fatigué de m’étayer par les coins
je suis allé te joindre, mon refuge
dans mes rêves tu entres dans ma bulle
- et le vent se charge du reste

obéissant à un ordre inconnu
mes pieds m’on offert leurs pas
je ne pouvais pas imaginer
qu’ils seraient autant, à ce point-là

pour te sauver de la planche
je me prenais par Ahab en fureur contre le cachalot blanc
(l’amour est le plus grand des mammifères)

en transmutant les peurs d’autrefois
j’ai banni les axes des centres sans équateur


* Imagem retirada do site Deviantart.

domingo, 23 de novembro de 2014

Poemas de Germano Xavier em Francês (Parte II)

*
Por Germano Xavier

"tradução livre"


terça-feira 18/11/14
As árvores amorosas (parte VII)

Les arbres amoureux (partie VII)

poème dédié à la femme charnelle

nous avons cheminé
longtemps ensemble

finalement la traversée
de la rivière détaillée du désir
le coucher de soleil déviant et brève
la nuit holistique sans histoire
les complets désarrois de l’être

puis nous avons raté
le phénomène des logiques
(subjectives)

et le baiser est né
à coté de la cocotte-minute
en plein dimanche inassouvi

un seul, unique baiser
coulé en nanosecondes



domingo, 26/10/14
As árvores amorosas (parte V)

Les arbres amoureux (partie V)

poème dédié à la femme Belle au-delà de la beauté

des mains froides
un cœur gelé
me poussent à créer
des vers meurtris
châtiés

voilà qui sèche
la poésie sans eau
la bouche est un puits vain
un creux tout nu



quinta-feira, 23/10/14
As árvores amorosas (parte III)

Les arbres amoureux (partie III)

poème dédié à la femme de l’Edifice Velázquez

ivre de vin et de désir
je regarde l’eau de la piscine
bleuâtre

des petits bateaux en papier
où naviguent mes pensées

le rituel ouvert sous la tanga de plage
signe de pression et fièvre
au cours des mois

la capitale sous ton joug est plus vorace

la fumée et les obscénités publiques
des quartiers

des doigts dans les chambres iguatemis
des gens dans les usines fantômes
des surveillants qui imposent les mains

l’amour se cache dans les armoires
pour ne jamais se laisser banaliser
il chavire les rouges à lèvres
de la cousine absente en voyage

c’est l’apprentissage froid des amants


* Imagem retirada do site Deviantart.

Nada muito sobre filmes (Parte X)

*
Por Germano Xavier


O SENHOR DOS ANÉIS (1978)

O SENHOR DOS ANÉIS (1978), do diretor Ralph Bakshi, é uma animação de pouco mais de 2 horas de duração que contempla as duas primeiras partes do grande clássico literário do escritor e filólogo J.R.R. Tolkien. O filme é interessante, mesmo para quem já se extasiou vendo as versões mais recentes dirigidas por Peter Jackson. A qualidade gráfica é um tanto duvidosa, mas o encanto da trama permanece. Bom para desconstruir certas imagens e alguns personagens. Há atropelos evidentes, mas vale como experiência. Recomendo a todos os mortais!


RELATOS SELVAGENS

Assisti ontem ao surpreendente filme RELATOS SELVAGENS (2014), do diretor Damián Szifron. Com Ricardo Darín no elenco, o filme dialoga com muitos dos elementos que marcaram época nos grandes escritos da Literatura Fantástica na América Latina. Também me fez recordar o grande Rubem Fonseca em diversas cenas. Situações surreais de descontrole e pulsão, violência e descompromisso para com a ordem social nutrem as tramas da obra. Um filme imperdível. Se eu fosse você, não esperaria muito tempo para vê-lo. Recomendo a todos os mortais!


O EXORCISMO DE EMILY ROSE

O EXORCISMO DE EMILY ROSE (2005), do diretor Scott Derrickson, é apenas mais um filme interessante do gênero suspense/terror que tem o antigo e polêmico ritual do exorcismo como pano de fundo. Exagerado demais nas cenas do julgamento do padre Richard Moore, deixando de lado o conteúdo assustador da trama. Escolha que, para amantes do gênero, conta muito na hora da qualificação da obra. O tema muito me atrai, mas confesso que esperava mais. Ficou devendo. Salve, salve!


GILBERT GRAPE - UM APRENDIZ DE SONHADOR

GILBERT GRAPE - UM APRENDIZ DE SONHADOR, dirigido por Lasse Hallström, é um filme de muita sensibilidade e beleza. A relação de dois irmãos e de todo um histórico familiar nada harmônico mistura-se ao clima de romance desencadeado a partir da segunda metade da película. Um filme sobre os amores incondicionais e, também, sobre a liberdade. Para ver com muito gosto. Johnny Depp e Leonardo DiCaprio em estados de maturação artística. Recomendo a todos os mortais!


O CHAMADO

Tenho mania de comparação quando o assunto é a refilmagem de obras cinematográficas. Por isso, não gostei de O CHAMADO (2002), do diretor Gore Verbinski, versão americana de Ring - O Chamado (1998). Não há como ficar observando com indiferença nem ficar sem fazer analogias para com original. Faltou muita coisa para ser realmente um bom exemplar de terror/suspense. Como entretenimento, talvez valha a pena dar uma olhada.


A NOIVA CADÁVER

Está aí um filmezinho que muito me tocou: A NOIVA CADÁVER (2004), dirigido por Tim Burton. Para você que gosta dos filmes do referido diretor, certeza de que irá encontrar muitos de seus elementos e enquadramentos costumeiros e que o tornaram um ícone do cinema recente. O filme é prova de que menos é quase sempre mais. Historieta simples, com um leve toque de crítica à ganância humana e muita fantasia, com tons mórbido-debochados. Uma película com a assinatura de Tim. Recomendo a todos os mortais!


HOTEL TRANSILVÂNIA

A animação HOTEL TRANSILVÂNIA (2012), dirigida por Genndy Tartakovsky, pode até agradar aos baixinhos, mas tenho lá minhas dúvidas se consegue agradar aos altinhos, como eu, que adoram toda a "mitologia" que há por detrás de incontáveis e memoráveis personagens clássicos da literatura universal, a citar Drácula (Bram Stoker) e Frankenstein (Mary Shelley). E, convenhamos, é papel da animação agradar os altinhos também, haja vista o crescente interesse de tal público pelo respectivo gênero cinematográfico. Ficou devendo, e muito.


DEBI & LÓIDE 2

20 anos depois, eles voltaram. DEBI & LÓIDE 2, dirigido por Bobby Farrelly e Peter Farrelly, presta-se a um tipo de humor nonsense cada vez mais raro nos ambientes de entretenimento que permeiam o mass media atual, um humor mais ingênuo e simples. Para quem riu muito com o primeiro filme da série, vale a pena dar uma olhada nesta continuação. A dupla é de riso fácil e cumpre o papel a que se destina, com honras. Recomendo a todos os mortais!


* Imagem: Google.

O Homem Hediondo Nº 5 em aventuras por terras mestrandas


Por Germano Xavier

Alguns registros imagéticos do início de minhas aventuras e desventuras por um mestrado em Letras.
Sigamos, bucaneiros!

Clique nas imagens para ampliar:






sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Escola Cordeiro Filho em excursão para Serra Negra-PE

*
Por Germano Xavier

A Escola Cordeiro Filho, principal instituição educacional do município de Lagoa dos Gatos-PE, realizou no último dia 16 de novembro de 2014 uma excursão para a linda Serra Negra, um dos pontos mais altos do estado de Pernambuco, passando pelo Alto do Moura, em Caruaru-PE, e pelo Centro de Artesanato de Pernambuco, na cidade de Bezerros-PE. O projeto fez parte do processo de ensinagem do presente ano letivo e teve como orientadores os professores Francisco Pedro, José Fernando Moura e Germano Xavier.

Clique nas imagens para ampliar:







* Imagens: Germano Xavier

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Poemas de Germano Xavier em Francês (Parte I)

*
Por Germano Xavier

"tradução livre"


Leia abaixo os poemas "Bagagem", "Aquelas febres" e "As Árvores Amorosas (Parte VI)", recentemente publicados aqui n'O EQUADOR DAS COISAS, agora traduzidos para a língua francesa. Boa leitura, bucaneiros!


terça-feira 11/11/14
Bagagem (poema)

Bagage

viens
donne-moi tes lèvres
et ses moussons d’été
pour assouvir mes soifs

viens
ramène accoudés à ton visage
tes empires de salive
en jus nucléaire de pulsions

viens
emmène ta rose
ta carte sans cartographie
portière ouverte à mes attaques

de naufragé



sábado 08/11/14
Aquelas febres (poema)

Ces fièvres-là

ces fièvres aux goûts âcres
et gorges opérées en semi-voyelles
qui n’osent pas quitter les bouches
ni pour l’extrême-onction

ces fièvres aux corps dormants
si chaudes dans la distance
et l’imaginaire qui raccourcit pour être et voir
ce qui se cache

ces fièvres de feu
qui nous transforment en bêtes
et nous impriment des empreintes
d’âmes sans silences

ces fièvres miennes et tiennes
l’aube des aliments combustibles
qui font éclore l’ébullition
des muscles qui pulsent encore



segunda-feira 03/11/14
As árvores amorosas (Parte VI)

Les arbres amoureux (Partie VI)

dédié à la femme de Seabra (Bahia, Brésil)

il y avait du vin au milieu du cercle
formé par le son attristé

des amis sans amitié
simulant par leurs voix
les douces distances

il y avait toi et moi
en différentes fréquences

et la fin de la fêté indiquerait
les chemins :

notre dernière chance pour demain


* Imagem retirada do site Deviantart.

sábado, 15 de novembro de 2014

Mais Bernardos para Manoel

*
Por Germano Xavier

minha homenagem ao Manoel de Barros
 

em qualquer canto
poeta olhando de ciminha
ou não

rede de algodão ou sombra
de árvore pantaneira
farfafolhando o que se redenta
todo dia

rebenta o homem dos Bernardos
e nos agoras de chão
espreita ombros
pousos e pios

de onde está
anuncia aos céus
sua nova gramática

de infinitar palavras


*  Imagem: Google.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Maurice, o pianista

*
Por Germano Xavier

"O silêncio é uma confissão".
Camilo Castelo Branco


Dia nublado. Vento frio varava varandas e pessoas. A noite era perto. Algumas coisas para os distantes desatinos das vistas humanas eram levadas. Uma cidade à espera, esparsas ruas. Um concerto de cordas e Maurice, pianista e compositor, atração maior. Fama de criar curiosas peças para piano. Maurice, antes do dia de hoje, resolvera que iria parar com sua arte. Longos anos. Já era a hora, dissera ao ser entrevistado por uma jornalista da tevê local. Maurice iria se exibir para o público pela derradeira vez. Prometera ao vivo um espetáculo singelo.

Uma pequena multidão tomou conta da praça. O pianista tocaria. Palco montado. Maurice faria tudo aquilo que um pianista sabe fazer. Maurice entrou no palco, caminhou na direção de seu piano, sentou, ajustou a distância do banco, envergou-se diante das teclas, parou. Maurice respirou profundamente. A plateia observava-o. Eram crianças, jovens, adultos, idosos. Havia um clima de despedida no ambiente. Maurice, neste momento, olhou para cima. Enxergou o firmamento. Céu negro, brilhoso, bonito. 

Por um momento, as memórias de Maurice pareceram atravessar um túnel do tempo. Havia refluxos, regressões. Não havia o futuro. Maurice, depois de se atravessar com a mente, era somente o agora. Concentrou-se com uma lentidão de moveres. O apresentador do evento, com sua voz radiofônica, incitou a plateia. O início estava perto. Tudo agora estava nas mãos de Maurice, literalmente.  Corpo, coração, olhos, mãos, tudo estava em seu devido lugar. 

Todavia, para espanto coletivo da massa ali presente, Maurice não mexeu um só dedo por longos minutos. 58 minutos, precisamente. Maurice não tocou, não fizera o que haveria de ser feito. Fez o que qualquer pianista em igual situação não faria. Ele não tocou! Não, não! Ele não tocou! O pianista não tocou. Ao piano, Maurice executou o silêncio. O pianista bramiu, em seu ato final, a grande pausa. Fez o piano tocar silêncio para que todos ouvissem os mais rarefeitos sons do mundo, que porventura jamais poderiam ser ouvidos se ele tocasse o teclado preto e branco de seu piano: os tambores dos corações sem pressa, as tonalidades das respirações fogosas, os sussurros das mentes operantes, os chiados nas pregas do couro das poltronas, sorrisos cantantes de crianças felizes, os pigarros carentes, as lamúrias de amor...

E todos escutaram pela primeira vez sons inaugurais. Foi como promover nascimenos ali, para muitos que se encontravam no local. Não tocando, Maurice tocou. Era sua última peça. Maurice, diante do negro piano, esperava algo. Era o ápice. O desfecho triunfal. Maurice meditou. O piano, imaculado, tocara naquela noite as melodias mais incríveis. Rapidamente, quase de esguelha, Maurice olhou para as gentes. Levantou delicadamente. Visitou com os olhos o pulso que sustentava o relógio. Achou por bem descer os lances da escada que dava para o fundo do palco. Depois, seguiu a lua.


Imagem retirada do site Deviantart.

A estradinha

*
Por Germano Xavier

para meu sobrinho Carlos Henrique

Carlitos
não se avexe em engrandecer
mundo é danado de doido
e meninar é trem-bão

faz assim:
vai de pouquinho
vai de mansinho
vai de tiquinho

que criançar é trem-bão

vai de tantinho
vai de passinho
vai discretinho

que pequenar é trem-bão

Carlitos
mas jamais se esquecer
de quando ser alto pra cima crescer
por dentro ainda e sempre ser
piquininho


* Imagem retirada do site Deviantart.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Edição 4 do jornal O EQUADOR DAS COISAS

*
Por Germano Xavier

Setembro foi mês de ver nascer a 4ª edição do Jornal de Literatura e Arte O EQUADOR DAS COISAS, publicação especializada brotada de um sonho antigo meu e compartilhado com muitas pessoas a partir de 2012, ano de sua materialização. A 4ª edição está luxuosa, com impressão colorida  e devidamente registrada junto à Biblioteca Nacional, agora contando com seu ISSN próprio, o que eleva o jornal para outro patamar. 

Nas palavras de Carol Piva, umas das editoras do jornal:

"O EQUADOR DAS COISAS" é uma publicação semestral, independente e sem fins lucrativos. É todo ele janelas se abrindo a uma literatura o mais esquiva possível das tais "amarras-mercado" naquilo que faz a gente residuar desgostos. Propõe o diálogo com autores, seus textos e imagens, equadores que nos chegam, livre e deliciosamente, de acolás vários e, ainda, dos artistas convidados. Nossa paixão é pela escrita... palavras, sons, imagens e até os silêncios deles... este intercâmbio entre línguas e linguagens. O jornal ziguezagueia entre os t(r)atos editoriais no Brasil, Estados Unidos e agora, muito bonitamente, também na Irlanda. Uma honra-deliciúra! Tudo aqui publicado é de responsabilidade exclusiva de seus autores."

O destaque da edição 4 fica por conta da entrevista com o escritor angolano José Eduardo Agualusa, feita por Iara Fernandes. Também estão com a gente nesta edição: Eabha Rose, Maita Assy, James Wilker, Rafael Kesler, Toni McConaghle, Little Eagle McGowan, Isabela Escher, Tatiana Carlotti, Zé Alfredo Clabotti, Sara Rauch, Carol Caetano, Paulo Cecílio, Leonardo Valesi, Marília Kosby e outros.

Com um sentimento misto de honra e prazer, participamos da FLU - Feira Literária de Uberaba 2014, em Minas Gerais. Somos muito felizes por fazê-lo instrumento de revolução e de promoção de amor para o mundo e para as pessoas. Que o Equador seja sempre centro de transformações e de bonitezas.

Agradecimentos a todos que fizeram e fazem o jornal, e em especial (como sempre) a Carol Piva. Você é o equador do Equador, Carol. Embarco neste sonho reverberado e potencializado em seus dentros infinitamente lindos. Que venha o número 5!

Endereços para envio de textos para seleção/Edição 5:

Contribuições em Português, enviar para:

germanoxavier@hotmail.com
carolbpiva@gmail.com 
fernandesiar@gmail.com
tcarlotti@gmail.com
 escher.isabela@gmail.com

Contribuições em Inglês, enviar para:
 
karimelimon@gmail.com
dawgrox@gmail.com
eabharose@yahoo.ie

Participe!

Algumas imagens equatoriais (Iara Fernandes e Germano Xavier):






quarta-feira, 22 de outubro de 2014

A flor na flor

*
Por Germano Xavier

(todas as fêmeas aragonitas impostoras descambam
na imagem do seu jardim de delícias)


em você há brotada uma flor
de carne orvalhada desde a boca
operando úmida ao movimento
das vontades de estame

é uma flor única
de grandes pétalas dobradas
cujo pólen se liquefaz
em mel viscoso

(para a boca
a sede é antiga)

o beija-flor em planos segundos
pousado sobre a imagem da Beleza
descobre o mistério da rosa-vulva
e célere logo opera o androceu milagre

o pequeno pássaro se agiganta
ao tocar com o bico o botão ancestral
magma-lava branca sem menosprezar
ares desce o canal dos desejos

em tal instante
a flor é para a língua
um cultivo de rotas


* Imagem retirada do site Deviantart.

domingo, 19 de outubro de 2014

Nada muito sobre filmes (Parte IX)

*
Por Germano Xavier


DRIVE

O filme DRIVE (2011), dirigido por Nicolas Winding Refn, é uma obra basicamente de estilo. O roteiro não é lá grande coisa, muito comum em longas dessa vertente. Até o fim da primeira metade, o filme faz do silêncio das cenas prolongadas um marco de captura do espectador. É realmente bonito o começo. A trilha sonora ajuda, e muito. Do meio para o fim, transforma a violência em mais um endereço para o Belo, apesar da dureza das cenas. Lembrou-me muito alguns clássicos dos anos 80 que tinham a violência sem disfarces como trunfo. A película mescla sentimentalismos e faz da sociopatia do protagonista a âncora que faz estancar o julgamento da quase inconsciência de suas ações. A todo instante, somos e estamos como/com o motorista. Recomendo a todos os mortais!


TOURO INDOMÁVEL

O filme TOURO INDOMÁVEL (1980), drama biográfico dirigido por Martin Scorsese, conta a história do Jake LaMotta, pugilista (uma espécie de anti-Rocky Balboa) que ascende profissionalmente de maneira avassaladora ao mesmo tempo que se vê derrotado em sua vida particular, por conta de seu comportamento desregrado e egoísta. É poético e dolorido. Um clássico do cinema, sem dúvidas. Filmado em preto e branco, com atuações muito convincentes e roteiro sensacional, o filme sobre o "Touro do Bronx" não pode ser deixado de lado, em nenhum momento. Recomendo a todos os mortais!


MENINOS NÃO CHORAM

MENINOS NÃO CHORAM (1999), da diretora Kimberly Peirce, é um filme denso, duro e que facilmente pode provocar indignação em quem o assiste. Baseado em fatos reais, a protagonista atende pelo nome de Teena Brandon, que quer mesmo é viver como Brandon Teena. Durante um certo tempo, ela consegue sustentar a sua identidade sexual masculina, mas o disfarce cai por terra e ela começa a ser alvo de uma violenta nuvem de preconceitos, até ser morta por um de seus amigos mais próximos. Recomendo a todos os mortais!


O BEIJO DA MULHER ARANHA

O BEIJO DA MULHER ARANHA (1985), dirigido por Hector Babenco, é uma produção cinematográfica dividida entre Brasil, EUA e Argentina. Baseado no livro homônimo do escritor Manuel Puig, o filme narra o convívio dentro de uma prisão entre Luis Molina, homossexual que passa suas horas inventando e contando filmes, e Valentin Arregui, heterossexual aparentemente preocupado apenas com seus segredos políticos. No decorrer do drama, os dois se aproximam e terminam por dividir suas dores e seus sonhos. O amor é alicerçado de uma maneira muito poética pelos protagonistas, haja vista a ambientação por demais insensível para o nascedouro de tal sentimento. Grande elenco nacional se mistura a Raul Julia e William Hurt. Recomendo a todos os mortais!


CLUBE DE COMPRAS DALLAS

O filme CLUBE DE COMPRAS DALLAS (2013), do diretor Jean-Marc Vallée, narra o drama vivido pelo personagem Ron Woodroof e é, antes de qualquer julgamento, uma bela lição de vida. Ron é diagnosticado com AIDS e os médicos dão a ele apenas 30 dias de sobrevida. A partir de então, Ron inicia uma luta quase solitária contra a indústria farmacêutica de seu país - e que também seria a luta por sua própria sobrevivência -, chegando a contrabandear produtos tidos como ilegais nos EUA e que serviriam para amenizar o sofrimento de pessoas que passavam por problemas semelhantes aos seus. Muito se fala das atuações principais, e não é por menos. O filme é realmente muito bom e merece ser visto. Baseado em fatos reais. Só achei o final um pouco fraco diante do conjunto da obra. Todavia, recomendo a todos os mortais!


ANNABELLE

ANNABELLE (2014), do diretor John R. Leonetti, definitivamente é mais um exemplar de "continuações" que não fazem jus ao filme inaugural, neste caso o bom e convincente A INVOCAÇÃO DO MAL. Fui vê-lo com muita expectativa ontem, pois admiro os bons filmes do respectivo gênero, mas a decepção ao fim foi evidente. O filme vai, vai, vai, a gente espera algo realmente diferenciado e quase nada acontece de interessante. Terminou sendo mais um "mais do mesmo". Algumas cenas louváveis, é claro, e assustadoras! Todavia, fica só nisso. Enredo fraco e muitas partes desnecessárias. Talvez valha pelo entretenimento, mas não entrará para o cânone do terror. Salve, salve, bucaneiros!


AS AVENTURAS DE PI

Revi o maravilhoso AS AVENTURAS DE PI (2012), do diretor Ang Lee. O filme é baseado no livro homônimo do canadense Yann Martel, que foi acusado de plagiar o livro "Max e os Felinos", de Moacyr Scliar. Eu já li o livro do escritor brasileiro e é mesmo impossível não identificar as semelhanças na narrativa. Polêmico, o certo é que a história de Pi é fantástica. Filho do dono de um zoológico, Pi é o único sobrevivente de um naufrágio que dizimou sua família e os animais que viajavam no convés. No bote salva-vidas, restou ele, uma hiena, um macaco, uma zebra e um tigre. Lutando contra seus medos e temores, Pi revela-se forte o suficiente para suportar as intempéries e sugere um encontro íntimo com Deus, a partir de seus flagelos e de suas conquistas diárias. Um filme para todas as idades. Um clássico de nossos tempos. Recomendo a todos os mortais!


A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO

A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO (1988), do diretor Martin Scorsese, é um filme baseado no livro homônimo do escritor grego Níkos Kazantzákis. Em meus tempos de menino, tempos também do videocassete, recordo-me que era uma película bastante polemizada. Talvez, até hoje. Hoje tive a oportunidade de revê-lo. Jesus, no momento da crucificação, é tentado pelo "mal" a visualizar como teria sido sua vida caso não fosse levado ao sacrifício em prol da humanidade. Como homem detentor de uma vida comum, Jesus passaria a ser visto como o mais reles dos traidores, a começar por Judas e Pedro. Para quem gosta de filmes históricos com teor bíblico, não pode passar sem vê-lo. Sem dúvida, um ícone do gênero. Recomendo a todos os mortais!


* Imagem retirada do site Deviantart.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Incongruentes

*
poema para a mulher dos seios disformes
Guantanamera tocava no player do coche branco

Por Germano Xavier

você me ensinava sobre Beleza
quando tirava o sutiã dentro do carro
sob os auspícios das luas claras da Chapada

antes eu acreditava que as linhas
(da vida) deviam ser perfeitas e equiparáveis

depois de você
passei a gostar das deformidades
das incongruências do corpo
das instabilidades da alma

teus seios enormes de mamilos rotundos
me revelavam as curvas que me destinariam
(eu-outsider) a partir de então
aos passos tortuosos que bem daria

o do lado direito pesava mais
era maior e não cabia em minha mão
peito generoso mas arisco

era doce o do lado esquerdo
menor e mais disponível
às sugações decameronianas

em saltos balouçavam lindos
em quiques nos perigos das apreensões
planetas de um novo sistema solar


* Imagem retirada do site Deviantart.

Padre, mãe

*
poema para a mulher que se escondia no hábito do padre

Por Germano Xavier

para você
acendo um fado português
no meio da tarde macia
de rememórias

no simbolizar o desalento
para o tempo investido e minhas culpas
de quase infância

o padre é a mãe

o ditado já diz
o hábito não faz o monge
muito menos a oração

sua mãe nem suspeitava
dos meus pensamentos
em ira por todas as trancas
o candeeiro nas ruas noturnas
nos domingos de missais
meu peito pueril não te assumia

precisei cruzar o país
e longe de pais que castram filhas
acabar de uma vez por todas
com sua candura impostora
com seus demônios de pureza

e após tanto sofrer em suas falsas falas
agora já lido em versos de Charles Bukowski
sangrado e singrado um homem como Simbad

larguei você no choro fingido
quando Goiás deixei no ônibus
de te abortar
de mim

que o caminho no escuro
imposto sob decisão interna
é lugar de olhos e almas arrancar
de luzes espocar sem falências
para novas mortes em se renascer


* Imagem retirada do site Deviantart.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

A casa azul

*
Por Germano Xavier


Frida Kahlo de branco
sem sangue de mortes
mas com vermelhos de paixão
na umidade lactante dos seios
- real casa de se morar

quem, em sã engrenagem amante,
não esticaria em sucção os lábios
perante a exótica mulher em pele?

(entro no mesmo bonde
o trem vem vindo varando ventos
a força é a de um deus invertido

meu corpo fuçado
invadido estou no chão
perfurado sou)

a exótica mulher me atravessa
uma dor só

um golpe
um ferro retorcido no meio do sexo
abrindo vazão para amor inda maior


* Imagem retirada do site Deviantart.

Olhares sobre Texto, Contexto e Coerência

*
Por Germano Xavier


CAVALCANTE, M.M. Os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2014. 175p.

Mônica Magalhães Cavalcante tem sua trajetória acadêmica voltada para a área da Linguística e suas adjacências, possuindo pós-doutorado pela Unicamp. Atualmente, atua como professora da Universidade Federal do Ceará, coordenando grupos de pesquisa sobre referenciação, intertextualidade e argumentação. É, também, autora de vários livros abordando problemáticas ligadas às esferas da língua.

Seu recente livro, intitulado de OS SENTIDOS DO TEXTO e publicado em 2014 pela editora Contexto, está organizado em 7 (sete) grandes partes, cada qual com subdivisões particulares e muito bem dimensionadas ao objetivo pretendido da obra, que discute desde questões referentes a gêneros discursivos, passando pelas sequências textuais e compreensão de textos, indo até estudos analíticos acerca dos tópicos discursivos e da intertextualidade.

Na primeira parte, sobre a qual esta resenha se debruça, a autora empreende um percurso investigativo que burila em abordagens referentes aos conceitos de texto, contexto e coerência, enfatizando a relação existente entre estes três aparatos. Para a construção de tal percurso, a pesquisadora tece discussões acerca das diferentes concepções de texto, dos variados tipos de conhecimento e de contextos, de coerência textual e de fatores de promoção de intertextualidade.

Na primeira parte do livro, ao qual podemos chamar de Capítulo 1, há uma preocupação mais evidente em explicitar as visões gerais existentes acerca das ideias de texto que se projetam e se difundem no meio acadêmico atual, tudo isso para se chegar ao entendimento do que seja coerência, fator de textualidade de importância primordial. 

A professora fez-se buscar perguntas e alterar respostas para suas problematizações nos arcabouços epistemológicos da Linguística Textual, chegando a apresentar ao leitor as diferentes modalidades de conhecimento que estão imiscuídas no todo do processo textual, beirando abordagens sintéticas que versam sobre a promoção de construções de sentidos e de referência.

Partindo das premissas de Marcuschi (2008), Cavalcante contorna as antigas noções de texto, que o viam como elemento lógico de base autoral e, tempos depois, como produto para cuja compreensão só seria necessário o conhecimento do código linguístico, conseguindo chegar aos postulados definidos e defendidos por Koch e Costa Val apud Cavalcante (2014), autores que tratam o texto como sendo, ele, um complexo de movimentos de base interativa e que levam em conta diferentes aspectos quando de seus pronunciamentos compreensivos. 

Ainda nesta perspectiva de assimilação do texto e de suas ações compreensivas, corrobora-se no capítulo em questão a ideia já presente em Koch e Elias apud Cavalcante (2014) de que quando se está diante de textos, seja ele pincelado de quaisquer especificidades , ativam-se os conhecimentos ditos linguísticos (regras da língua), os conhecimentos enciclopédicos (memória permanente do indivíduo – também chamado de conhecimento de mundo) e os conhecimentos interacionais (formas de interação). 

Na trama que se instaura a partir do embate do leitor para com o texto, surgem outras preocupações, como as de ordem do contexto, para a autora mais um elemento de construção de sentido bastante salutar. Interessante é ver a metodologia que a professora utiliza para fins de esclarecimento de suas análises. A todo instante, dentro de OS SENTIDOS DO TEXTO, há uma apreciação de incontáveis exemplos de textos, que auxiliam o leitor na hora de efetuar a construção do saber imbrincado nas páginas escritas. 

Cavalcante (2014) utiliza-se, ao longo de todo o seu livro, de vários anúncios publicitários, notícias, reportagens e charges, entre tantos outros gêneros textuais, deslocando o leitor de sua obra para a percepção aplicada de seus questionamentos. É como se a autora desmistificasse diversas instâncias e até convenções referentes ao entendimento do texto, colocando-o no lugar de artefato complexo e dinâmico, passível de interpretações minuciosas e articuladas com elementos sociocognitivos diversos.

Não sendo tarefa banal a de se produzir ou ler um texto, Cavalcante (2014) elenca ainda implicações da ordem dos fatores de textualidade, que desembocam num olhar mais apurado do professor perante indícios de correção dos materiais produzidos ou lidos. Continuidade, progressão, não contradição e articulação são alguns dos aspectos pronunciados pela autora e que, como tais, permitem ser inscritos como identificadores essenciais do processo de construção do texto.

Talvez, a grande marca e maior mérito de OS SENTIDOS DO TEXTO seja mesmo a proximidade discursiva presente no corpo textual em relação à dualidade ensino-aprendizagem (ou ensinagem, numa terminologia mais moderna), que possibilita um uso facilitado daquilo que está em forma de linguagem verbal, impresso no papel. 

Não é difícil perceber que se trata de um livro com/sobre práticas e que existe, por sua vez, em prol da profusão de outras e reformuladas novas práticas. Ao se empregar importância ao que o professor ou estudioso de língua, por exemplo, poderia propor junto ao seu alunado ou público-alvo no tocante às conjunturas sociolinguísticas, sua leitura se torna, no mínimo, inspiradora. 


* Imagem:  http://www.editoracontexto.com.br/blog/coesao-e-coerencia-textual-o-que-e-isso/

Lições divinas

*

um presente lindo de minha ex-aluna, Júlia Anna, 
no Dia dos Professores


O professor é uma espécie de Jesus Cristo
Apesar de, muitas vezes, crucificado
Possui a missão de salvar seu semelhante
Das garras e cegueira da ignorância
Tem o dom de gerar vidas renovadas
Sensibilidade para inspirar histórias mais dignas
Humildade para entrar na "luta" alheia
Intuição para resgatar o potencial do outro
Força necessária ao estímulo da confiança
E habilidade em semear esperanças férteis

O professor não desiste do outro
Não o abandona
Acredita em dias melhores
Em vidas realmente "humanas"
Compartilha seus ensinamentos
Em forma de amor e fé
Não desiste principalmente
Daqueles "casos perdidos"
Que desabrocham em suas mãos
Exalam o cheiro do suor honesto
Em provas de seus esforços
E exemplos disseminados a seus discípulos

Uma profissão iluminada
De força, revolucionária
Antes de tudo, mestre em amor
Tem a educação como religião
E a resiliência como fé
Verdadeiros profetas!
Por isso são temidos por muitos
Que reconhecem poder em suas mentes
"Armas" em suas mãos

Seu fardo é pesado
Porém, esse sacrifício é o que liberta
Reúne seguidores os mais fieis
À sua imagem e semelhança
Abençoados em sabedoria
Fortalecidos em aprendizados de coragem
Firmes a cada passo no hoje
Crentes na vitória do amanhã
Vitoriosos em cada transformação cotidiana


Obrigado, Júlia. 
Repasso a homenagem a todos os bons professores do mundo!


* Imagem: Google.

domingo, 12 de outubro de 2014

Para ser criança, um espanto

*
Feliz Dia das Crianças a todos!

Por Germano Xavier


porque piscam luzes dentro de mim,
e eu sou apenas uma criança, arrebatada,
diante do mago brinquedo
(Rotina de Viagens, de Germano Xavier)

Escrevi o haicai supracitado lá pelos idos de 2009. O motivo de escrevê-lo, já não sei se recordo mais. Talvez nem motivado por algum acontecimento real ele tenha sido. Todavia, acerca de sua temática, rapidamente consigo detectar sua simples lógica existencial. Trata-se um haicai sobre o espanto. Um homem que, em determinado momento, enxerga-se tal qual uma criança que está diante de um mágico brinquedo, arrebatado a ponto de ficar com a alma iluminada. Sim, um pequenino poema sobre o espanto, sobre os espantos.

Eis aí, talvez, o segredo para a felicidade mais profunda: cultivar, com amor, sabedoria e longevidade, a capacidade que possuímos de nos espantar diante das mínimas coisas. Espanto é um substantivo masculino que pode significar qualquer surpresa causada por algo de singular, de inesperado. Tudo aquilo que nos causa algum susto, assombro ou pasmo. O espanto pode ser também o elixir da longa vida, dos longos sorrisos, das duradouras interações para com o mundo e para com as pessoas que nos cercam cotidianamente.

O espanto nasce na gente quando ainda somos crianças. Brota dentro e utiliza-se de nossos órgãos sensoriais para se materializar. O Belo – e dentro cabe o Feio também -, quando aos olhos do espanto, tem intensidade de perplexidade. As mãos se fecham, os olhos se abrem, as pernas tremem, enfim... o corpo inteiro aprende rápido a demonstrar espanto. O que possuímos de mais interno, por sua vez, também segue as sensações sentidas e observadas por nosso lado exterior. O espanto é movido e motivado pela Beleza. 

As crianças enxergam o Belo com mais facilidade, pois estão olhando as coisas pela primeira vez. As crianças inauguram as coisas e o mundo cada vez que se espantam. Espanto é encanto. Espantar-se é encantar-se. Os adultos, muitas vezes, perdem tal habilidade. Muitos adultos não se deixam encantar. Encantar-se é uma forma de encontrar a Deus. Rubem Alves reforçava isso: “Deus é alegria. Uma criança é alegria. Deus e uma criança têm isso em comum: ambos sabem que o universo é uma caixa de brinquedos. Deus vê o mundo com os olhos de uma criança. Está sempre à procura de companheiros para brincar”.

Em tempos de se comemorar a criança que há em nós, semear espantos em nossos corpos e almas torna-se atitude urgente para que não deixemos morrer nossas infâncias de maravilhas. Ser criança é querer e fazer o que se quer sem temer a nada nem ninguém. Quando nos tornamos adultos, ser criança não é apenas se esforçar mentalmente para se voltar ao passado e agir como um dia agimos, mas olhar o futuro com olhos desenvoltos, armados de uma liberdade conquistada com o aparecimento dos fios brancos na cabeleira, tentar viver o que é real e elaborar realidades para o que ainda é sonho. E sonho, todo mundo sabe, sonho é espanto dentro da gente. 


* Imagem retirada do site Deviantart.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O pão e as rendas

*
Por Germano Xavier

o pão
- ou a maçã que alimenta -
fermenta por debaixo
das pequenas dobras da carne
das suaves rendas brancas

é líquido o pão
é líquida a maçã

rio de água de sabor agreste
sentido fluido por entre lábios

a apurada correnteza
os lacrimais suores das coxas
o naufrágio das línguas

o pão

* Imagem: Google.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Rubem Alves e a arte de embonitar o trivial

*
Por Germano Xavier

Num minúsculo excerto intitulado “Falar”, presente em seu livro DO UNIVERSO À JABUTICABA, o campinense Rubem Alves, falecido em 2014, escreveu: “Há um princípio para o falar que tento obedecer, mas não consigo. No entanto, acho-o absolutamente correto: “Só fale se sua fala for melhorar o silêncio”. Se a sua fala não melhorar o silêncio, é preferível ficar calado, para que o silêncio seja ouvido. Estou me exercitando nesse princípio e acho que estou falando cada vez menos. Até se queixam de mim como sendo má companhia em festinhas alegres”. Pois bem...

Eu poderia enumerar várias passagens marcantes do supracitado livro, mas me atenho a esta citada no parágrafo acima para justificar um pouco do que estive pensando há poucos instantes. Rubem Alves sempre foi visto com certa (ou seria incerta?) desconfiança por grande parte dos supostos “entendidos” da sapiência tupiniquim, principalmente pela intelligentsia que perambula pelos meios acadêmicos e que, incontestes vezes, julga-se detentora do conhecimento máximo e utilitário existente no mundo. 

Já ouvi vários professores falarem mal ou desconversarem sobre a real importância de alguns autores que são, de fato, fundamentais para se pensar determinados segmentos sociais e/ou epistemológicos. Mas, por que assim percebem a obra de Rubem Alves e de tantos outros grandes nomes das literaturas? Só pelo fato de Rubem Alves ter refletido e escrito acerca das coisas aparentemente “mais triviais” da vida? Somente pelo fato deles terem olhado com sutileza o ser humano, suas feiuras e suas bonitezas, ou porque o seu legado maior – no caso de Rubem Alves - fora redigido em formato de crônica, este gênero que já nasceu taxado de literatura menor e que ainda hoje é visto com certa restrição por várias pessoas do ramo? 

A minha resposta-pergunta pode estar coerente e suscitar algumas verdades, todavia também pode funcionar como uma espécie de provocação. O referido cronista não está só quando o assunto é desprezo ou pouco apreço a obras que não dialogam com uma determinada “cientificidade”, quase sempre gerada e gerida seguindo um ordenamento bossal, faustamente frio, mas que tem o poder de legitimar o verbo, empoderando muitos que não o merecem e diminuindo o mérito de outros que são mais do que reis em suas áreas. 

Perto dos 30 anos de idade comecei a descobrir a obra de Rubem Alves, um sujeito-autor que escreve simples sobre caquizeiros e crianças, mas que também fala de coisas “mais sérias”, e que mesmo quando não escreve nada daquilo de que eu realmente gostaria de ouvir, sempre soube me presentear com momentos belos de silêncio, o que é fascinante para mim. Ler o silêncio dos outros é mágico. Aprender com ele, sensacional! Até quando escrever sobre nossas maiores banalidades é ser inferior? Até quando taxaremos com um "serve" e um "não serve" a literatura de nomes de real expressão?

Rubem Alves é o tipo de escritor que, quando fala ou até mesmo quando não fala, consegue melhorar o silêncio. Melhora os meus silêncios, não sei os seus. Não posso falar por você, até porque somos tocados por sons os mais diversos. Nos quesitos educação, sociedade e humanidade, Rubem Alves foi um monarca, merece nosso apreço e nossa leitura. Porém, que não seja nada aprofundado ou sistemático, pois foi poesia o que Rubem Alves escreveu em todo o seu percurso vital. E poesia, como diria Manoel de Barros, não é para entender. Poesia é para incorporar.


* Imagem: Google.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

A suprema dança das orquídeas

*
Por Germano Xavier

“Não é possível não dançar.”
(Y. Yevtuschenko, poeta russo)

Deus é um dançarino. The lord of the dance, imaginemos. Sapateia mais que Michael Flatley. Deus está nas pequenas coisas e nos mínimos acontecimentos. Deus está nas grandes coisas e nos eventos monumentais. Deus é um marco, um começo sem fim. Deus também é um fenômeno. Olhe para você, aí, agora, prostrado diante do mundo todo! Somos o símbolo máximo da existência divina. Muitas pessoas já escreveram o que acabei de escrever. Mas eu jamais havia escrito o que acabei por escrever neste exato instante. Deu-me vontade.

Deus não construiu templos, não precisou nem precisa. Deus é um insetinho colorido que pousa em nosso antebraço. Deus é maravilha. Maravilhas, melhor dizendo. Melhor assim, no plural. Deus é a própria Beleza. Deus é o Belo. Deus é o Feio. Deus é. Deus sempre foi. Deus sempre será. Todo mundo um dia descobre a Deus, todo mundo um dia descobre um Deus. Todo mundo um dia se descobre. Todo mundo um dia pode se descobrir Deus. Todo mundo um dia pode achar que Deus é uma farsa. Deus pode ser ou não ser efêmero.

Eu conheci Deus num dia de muita angústia e solidão. Eu estava perdido no mundo, longe de minha família, longe de quem realmente se importava comigo. Num quarto alugado, numa cidade que nunca permitiu ser minha, ligando para uma alma salvadora qualquer que me entendesse debilitado, nem a senhorinha dona do estabelecimento-pensão podia ouvir os meus gritos de silêncio. Deus me apareceu naquele cômodo, na noite mais fria que já suportei. Deus me pareceu o Amor.

Depois do torvelinho noturno, eu era esperança e olhos fumegantes de amor pela vida. Deus me esbofeteou na primeira oportunidade que tivera. Depois da queda, levantei como um titã. Peguei o rumo e a estrada, pus a mochila nas costas e singrei caminhos de renovação interior. Foi quando aprendi a nunca desistir de nada, principalmente a nunca desistir de fazer bem ao próximo. Foi quando aprendi que se eu não fizer o meu passo, ninguém jamais o fará por mim. Deus estava me ensinando a dançar. Eu, que até então sempre havia sido duro de corpo, aprendia ali que a alma também possuía molejo.

Dali por diante, Deus estaria sempre sendo apresentado a mim, mesmo nas piores derrotas. Derrotas também nos dignificam, não é verdade? Deus havia se transformado em jardins e labirintos, em ruas sem perversidade, em distâncias superadas, em sorrisos profundos, em palavras sem opressão, em gostos os mais devidos, em fortalezas insubornáveis, em regras de liberdade, em metáforas reais, em corações para amar, em mãos para plantar árvores de Bem.

Soo clichê e não me importo com isso. Deus é também um clichê. A vontade que se transmuta em Bem, por sua vez, não é um clichê. É nisto que me assento. Deus é o Bach que escuto agora. Deus é a melodia de Bach. Deus é o dedo de Bach. O instrumento. A música. Deus é a possível dança que pode ou não ser dançada. Deus, como disse anteriormente, é um marco, um começo sem fim. Deus está onde menos esperamos. Deus sapateia mais que Michael Flatley, eis uma certeza. Deus dança, eu sei. 


* Imagem retirada do site Deviantart.