sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Desbunde


Por Germano Xavier

Eu ficaria bem se tivesse permanecido ali, mesmo imótuo ou com aquele ar de criança chorando por querer tomar um pouco de sereno na noite que desce, sim, eu ficaria muitíssimo bem. Principalmente se jamais me passasse pela cabeça que o momento do agora não fosse coisa tão real assim. Pôr fim a um amor é encontrar um deserto, pedir ao pai do mundo, o criador do céu e da terra, um instante de silêncio para que toda a intensidade do abalo sísmico humano seja capaz de ser absorvido e interrogado se. É quase ter de pensar que com muito menos pesar ou dor poder-se-ia pensar em outra coisa qualquer, arrojada numa esfera destituída de lamentos, discórdias e decepções. Eu penso em como é inútil o pensar nestas horas! Parece mais a forma do abisso se formando por detrás das nossas retinas, a cor do inferno empapando as bolsas embaixo de nossos olhos, a febre doentia do molestado arruinando o corpo da alma e a alma do corpo, a corrente presa à pata traseira de um corcel indomável, este mal que me toma, este mal que me traga, este mal que não me soma... como é desnecessário o fim tendo começado esta toda história, agora estória, como é imprestável o pensamento feito de amargor! A quem cabe a engenharia das desamarrações? A quem se presta a patente das forçadas indiferenças? E pensar que deste modo estarei desistindo de tudo, principalmente do que fiz e que simplesmente ficou, por um motivo ou outro, descomposto e com o alicerce frágil, pois sonho era, e apenas, e ainda... e quando é a pergunta que fica, capitânia, capital, cercando o horizonte do porvir talvez. Grosso modo, quando um amor termina, os astros no firmamento afirmam, desbrilhados, que é hora de apagar as luzes e pôr as estrelinhas para dormir. E quando é a pergunta que torna sempre, que corteja o tempo infiel, que desabilita a juventude das certezas mais certas. Eu gostaria de ter ficado até o fim e no fim ter de contar uma outra história, ou ter conseguido beirar o sonho e realizar ao menos os desejos ou as vontades, estes édens. Mas se é para pôr fim, então que seja simples, porque é no simples que o amor persevera. Dou-te adeus, ex-amor.

"Recebi esta MISSÃO do blog da Pâmela Rodrigues, que consiste em criar uma carta terminando um relacionamento com alguém. Essa idéia surgiu a partir da exposição Cuide de Você, da francesa Sophie Calle. Ela convidou 104 mulheres para interpretarem um email de seu ex-namorado que gostaria de romper o relacionamento de ambos. Espero ter me saído bem, literalmente. (Escrito em 2009)"

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