segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Mariana Basílio e o seu NEPENTE: um breve diálogo

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Por Germano Xavier


NEPENTE é o título do primeiro livro de poemas de Mariana Basílio, 26, poeta graduada em pedagogia, mestre em Educação e natural de Bauru - SP. O livro é um recorte poético que demarca o homem, o tempo e a natureza da vida. O tempo em NEPENTE é um tempo de acabar-se, de polir-se em terminuras, em fins e inícios, tempo da passagem do próprio tempo: a possibilidade do ser-além, do aprendizado constante. Aprender que é, antes de tudo, espantar-se. Porém, NEPENTE é também latinidade, é a contemplação dos mortos de Gaza, é a eternidade inaudita dos gritos mundanos, é o corpo como oração déspota, é a lembrança cigana de terras invioláveis, é o céu e o sol dos mantos das deidades, o “instante total da vida”: o amor.


1. No poema REBENTO, você escreve “Minha intenção é a pura essência” e se questiona logo após “(e qual a essência verdadeira?)”... Aproveitando tais versos, pergunto a você, Mariana, qual a essência e qual a intenção de seu NEPENTE?

Posso começar a falar dessa tal intenção-essência pelos versos finais do próprio Rebento: “Sinto-me ampla e ausente, /o rebento impensado da pureza, /coração poente”. Primeiramente, devo dizer que a principal intenção dele (Nepente), antes mesmo da formação dos conteúdos poéticos, foi a de me libertar, me assumir poeta. Este momento veio aos 25 anos. Pensei no Nepente timidamente, como uma espécie de salvação minha, um ritual, para que eu pudesse nascer, me crescer poeta.

Já a essência, mesclada com a intenção poética do livro, dos temas e do estilo nepêntico, foram moldando-se a partir do primeiro poema, nada foi muito pensado antes disso. Mas o sentimento da palavra-mãe “Nepente” – a tentativa de escrever um livro-poção contra a tristeza e o sofrimento, me levou a falar sobre rebentar-se mesmo, libertar-se, dizer um pouco da alma, da natureza, do místico, social e religioso - isso esteve comigo em todo o percurso até a finalização da obra.


2. NEPENTE, desde a epígrafe que abre o portal poético do livro, passando por referências a grandes escritores do passado e indo até a escolha das imagens que vão ao miolo, possui uma atmosfera de estampa demasiado clássica. Até que ponto este aspecto é proposital em sua escrita de agora e o que isto significa?

O próprio título do livro, Nepente, é originário de uma obra clássica, a Odisseia de Homero. Ocorre que talvez essa atmosfera tenha acontecido a partir de minhas leituras, que têm referências de importantes autores clássicos, alguns citados-homenageados no livro, como Dante Alighieri e William Blake. A capa e as imagens do livro são obras do maravilhoso pintor inglês, do meio do século XIX, John William Waterhouse. Elas casam bem com esse universo, entre o que leio e o que tentei viver na obra.

Não foi nada proposital, aconteceu simplesmente surgirem os temas, os poemas, a junção do todo. Mas o meu livro é um amador, um iniciante, todo cru mesmo – foi somente o meu saltar, a engatinhar na Literatura. E se me perguntares, te direi como sempre o quanto eu sou exigente comigo mesma. Então, não consigo vê-lo como um ar realmente clássico, mas compreendo que, comparado a várias coisas que vemos na poesia contemporânea, ele pode ser visto por várias pessoas como algo que emana essa atmosfera.

Enfim, vejo o Nepente como uma criança a tentar descrever várias coisas, muito vagarosa ainda, insegura. Mas que vai adiante.


3. Em alguns poemas, é perceptível o tema da fuga, da busca, do itinerário a seguir... a poesia serve para que se chegue a algum lugar?

O livro começa com poemas envolvendo, dor, morte, sofrimento, e desenvolve-se em alguns questionamentos, fugas, transformações, até tornar-se mais leve, a voar.

Quando os escrevi, foi como viver várias fases que vêm e que vão muitas vezes em nossas vidas; escrevê-los foi então uma forma de superação das coisas.

A poesia serve para que não sejamos engolidos pelas dificuldades cotidianas, para que não nos alienemos com as dores e as barbaridades que muitas vezes vivenciamos ou sabemos que existem, simplesmente. Ela existe para eclodir um tudo, mesmo que exista um nada. Para mim, a poesia é um portal para se ser plenamente, no campo da alma, no fundo dos nossos olhos.


4. Se há uma palavra que me chamou a atenção em seus versos, foi a palavra ETERNIDADE. Qual o sentido da “eternidade” em NEPENTE?

Tem um sentido espiritual, místico – de uma possibilidade de existência para além de elementos de vida e morte. O sentido foi libertário, de se existir para ser eterno, ao menos por instantes, sentir-se eternamente ligado aos elementos místicos, naturais, sentimentais – para sermos outros, sermos sempre levados a uma transformação.


5. Por que poesia, Mariana?

Por que a vida, Equador das Coisas?

É isso. Como dizia Herberto Helder: o poema faz-se contra o tempo e a carne.


NEPENTE (Giostri, 2015), de Mariana Basílio.
* Imagens: Acervo pessoal da autora.

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