NEVES, M. H. M. Que gramática estudar na escola?. São Paulo: Contexto, 2003.
Logo no início do capítulo do livro Que gramática estudar na escola?, intitulado de Para uma gramática escolar. Linguística, uso linguístico e gramática na escola, de Maria Helena de Moura Neves, visualizamos facilmente a presença de um esboço acerca da importância e, também, da dificuldade que é pensar o supracitado tripé dentro da heterogeneidade do ambiente escolar. Neves, considerada uma das maiores vozes do pensamento linguístico nacional, opera seu discurso partindo do pressuposto de que ainda não se deu uma junção clara e ideal entre o que Clairis (1999, p.35) chama de “dinâmica linguística” e as possíveis referenciações paralelas à “descrição gramatical” relacionada aos processos da língua que se relacionam com a gramática. Publicado em 2003, o livro da professora aposentada da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp é um esforço em prol da construção de uma visão de gramática funcionalista, onde o que mais interessa é, deveras, a língua em funcionamento e todas as suas respectivas determinações a partir de seu uso ou de sua manipulação.
No referido capítulo, a pesquisadora traça, em diálogo com Clairis (1999), uma grade de perspectivas envolvendo o portfólio histórico que abarca as visões gerais acerca da gramática, assim como de seus usos mais antigos e duradouros. A conclusão a que se chega indica que a gramática, enquanto elemento público cultural demasiado prático sempre se revelou um grande artefato constitutivo de representações de poder e/ou de autenticidades identitárias mundo afora, fato que sempre a manteve num alto patamar de relevância dentro dos alicerces sociais e políticos dos povos.
Apesar de divergirem em muitos aspectos, as visões mais comuns acerca de gramática que se têm hoje ainda não conseguiram fugir do ideário de que ela, a gramática em si, é, no fim das contas, um arcabouço de base dogmática que visa exclusivamente à obtenção de esclarecimentos da ordem do Certo X Errado, uma das dicotomias discutidas no texto em questão. Se formos fazer um pequeno apanhado histórico tendo em ponto maior a gramática, esta aqui observada tal qual um campo de estudo da língua, perceberemos que seu surgimento se deu ainda na Grécia Antiga. Naqueles idos, a gramática possuía caráter essencialmente normativo (grammatiké, pois, significa “a arte de ler e escrever”) e, por um ou outro motivo, alongou-se a manter tais propósitos.
Ao analisar a conduta agregada à noção de gramática dentro da esfera da escola e, no mesmo compasso, no interior de um turbilhão de filosofias educacionais e ideologias pedagógicas que parecem florescer a cada nova estação, Neves (2003) discute algumas dualidades conceituais que elaboram hoje o básico das discussões que tematizam o uso gramatical, a começar pela já referida noção de Certo X Errado, passando pela problemática do Uso X Norma Padrão, Língua Falada X Língua Escrita, indo até desembocar em quesitos referentes à Descrição X Prescrição.
Em tais interlúdios conceituais, que nem sempre dizem respeito apenas ao domínio do uso linguístico, a linguagem viva de todos os seres humanos mostra-se não linear, mutante e cada vez mais arisca aos cimentos do tempo. Por trás de todo este fenômeno, a gramática se esconde em entendimentos inúmeros e de certa maneira comumente equivocados, que muitas vezes a impedem de seguir seu caminho com uma maior desenvoltura.
Decerto, a principal imagem construída ao se usufruir da leitura do texto da professora Maria Helena de Moura Neves é a de que o conceito de gramática é muito extenso, já que graúda é a esfera do saber linguístico ao qual ele está imiscuído. Por grande ser este espaço de averiguação científica, fica instalada aí uma problemática de igual dimensão. Afinal, como usar a gramática e qual a melhor forma de enxergá-la ao se tratar do ensino de língua?
* Imagem: http://www.deviantart.com/art/In-one-word-179108260
Um comentário:
Feliz quarta-feira!
Germano blogueiro querido, este texto está demasiado de bom.
Fraterno abraço
Nicinha
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