segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Sobre Março entre Meridianos, de Luísa Fresta



Por Germano Xavier


MARÇO ENTRE MERIDIANOS (EAL, 2018) é o terceiro livro de Luísa Fresta - ou melhor, de Muhatu (seu pseudônimo) - e foi o vencedor do Prêmio de Poesia no Feminino "UM BOUQUET DE ROSAS PARA TI", organizado pelo MAAN - Memorial Dr. António Agostinho Neto, em Angola no ano de 2018. O livro é dividido em três "cadernos": Caderno 1 (Cartão-Postal), Caderno 2 (Versos natalinos e outras histórias de (en)cantar) e o Caderno 3 (Palavras pintadas na tela).

Em Cartão-Postal, percebemos uma autora preocupada em revelar os centros de pequenas coisas, os núcleos sísmicos de elementos que fazem a vida de todas as pessoas, mesmo que estas fontes interiores e, por vezes, ulteriores de e acerca da vida sejam ou estejam integradas à própria faculdade vital do ser humano: o viver, o estar vivo-e-além. Neste Caderno 1, a poeta fotografa o caos, registra os medos de nós-gentes e articula a madeira que fará o fogo-máximo de nossas idas e vindas, de nossas descobertas e de nossas decepções. O soneto é a porta de entrada formal para a voz quase maternal da autora, que nos ensina a sentir mais, mais e mais. 

Os versos são dotados de uma maior liberdade no Caderno 2, intitulado de Versos natalinos e outras histórias de (en)cantar, Muhatu nos questiona se a felicidade é um bônus ou uma guilhotina. É a hora de tombarmos por cima das farturas e das fraturas dos símbolos mundanos, referenciar o sagrado nas coisas triviais e bulir com o absurdo das naturalidades cotidianas oriundas de convenções sociais e institucionais. Tudo isso, regado com uma boa dose de maturidade artística e pessoal. Aliás, ensinagens não faltam nas páginas do livro e na obra geral escrita por Luísa Fresta.

Já em Palavras pintadas na tela, a escritora quase ignora o real para nos abrir um mundo de percepções suavemente surreais, quando no tempo das intermitências e das incertezas da vida, colocando-nos numa posição de combate e, também, de respeito perante o tempo futuro. Afinal, o que faremos da vida que nos resta? O que estamos fazendo com o nosso Hoje, com o nosso Agora? Aquela velha batalha já por demais esgotada e profética: cada dia que passa é um dia a menos, não um dia a mais. Luísa Fresta é, por fim, a voz de uma infância revista e ressonhada, cheia de memórias e refundada em anunciações. 


* Imagem: Acervo Luísa Fresta

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