quinta-feira, 18 de junho de 2015

Olhares e percepções sobre intertextualidade

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Por Germano Xavier


BAZERMAN, C. Escrita, Gênero e Interação Social. São Paulo: Cortez, 2007. [Cap.03]


O capítulo 3 do livro Escrita, Gênero e Interação Social elucida, com destreza metodológica e consciência transdisciplinar, a grandeza e a relevância das questões ligadas ao conceito de intertextualidade – ou melhor, de intertextualidades – observado no todo do complexo ideário de um dos maiores nomes referentes aos estudos dos constituintes do texto na contemporaneidade, o professor Charles Bazerman, hoje pertencente ao quadro profissional do Departamento de Educação da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, Estados Unidos da América. As pesquisas lideradas por ele encontram-se, em sua maioria, voltadas para a prática e para o ensino da escrita, vista aqui numa totalidade conceitual, em um contexto de ordenação histórico-social. 

No referido capítulo, Bazerman (2007) traça de início, em diálogo com os autores que fundaram avanços importantes no quesito do entendimento das engrenagens do texto em si, a citar Mikhail Batkhtin e Voloshinov, um panorama expositivo das visões acerca dos conceitos de intertextualidade que preponderam ao longo dos avanços linguísticos gerados no seio da sociedade e, também, na esfera acadêmica. 

O autor é partidário da ideia de que o texto não é uma matéria de cunho original, mas o contrário, para ele todo texto porventura produzido é antes um elemento que se banha na existência de outros textos, precedentes e motores das e para as novas formulações textuais. Neste viés de entendimento, Bazerman (2007) estipula a condicionante de que tanto a leitura quanto a escrita relacionam-se entre si ao passo em que se escreve, numa resposta explicita e/ou não-explícita ao movimento de leitura realizado anteriormente pelo sujeito escrevente.

Destarte, pode o fator intertextualidade nos encaminhar ao desenvolvimento e ao aprimoramento de nossas práticas enquanto indivíduos e enquanto coletividade, tendo com ponto basal a produção dos inúmeros modelos textuais? Eis uma pergunta que perpassa toda a preocupação exibida no capítulo em questão. 

Ao discorrer sobre as contribuições bakhtinianas e, também, de Voloshinov, o professor busca refazer ou reestabelecer uma definição mais concreta e uma compreensão notória em cima do que realmente seja intertextualidade, suas funções e seus desdobramentos, a fim de que constructos notadamente embasados nas conjecturas histórico-sociais possam, sem titubeações ou enfraquecimentos, corresponder às mais recentes demandas dos educadores, dos pesquisadores e dos estudiosos do letramento em geral.

Apesar de algumas discussões de ordem não fundamentais para as análises aqui consequentes, Bazerman (2007) salienta a importância de Julia Kristeva para a profusão do ideal contemporâneo de intertextualidade. Ao cunhar pela primeira vez o termo intertextualidade, Kristeva acaba por ligá-lo ao conceito de rede/mosaico de citações, o que faz abrir um imenso caleidoscópio interpretativo-conceptual, porém um tanto já direcionado e devidamente realizado em suas primárias contextualizações.

Assim feito, para o autor, a intertextualidade terminaria por se conectar ao pensamento que incute ou se une a uma engrenagem por meio da qual o sujeito escrevente acaba por se escrever a si próprio dentro do fenômeno do texto social. Assim posto, seria bastante lógico pensar que é justamente o texto social que nos escreve, ou ainda, que nos escreve a uma dada noção de coletividade a partir da noção de texto.

Contraponto algumas perspectivas ora semelhantes ora diferenciadas de Voloshinov, Saussure, Bakhtin, Barthes, Riffaterre, Vygotsky e Genette, o pesquisador trilha um caminho de reconhecimento inerente aos fatores que não dissociam ou liquefazem a perspectiva de intercâmbio textual. Bazerman (2007) desautoriza-se quanto às preocupações concernentes ao status do autor e, por conseguinte, no tocante aos modos de consciência expressamente fixos à ficção, também. 

Não obstante o prezado pesquisador realizar uma espécie de reflexão a partir dos tipos de competências/habilidades e debruçar-se sobre escaramuças técnicas necessárias ao desenvolvimento dos indivíduos no interior do mundo textualmente complexo e diverso da modernidade, o autor pronuncia-se em visão confortavelmente desenvolvida e sedimentada, servindo-se de mensageiro de todo um prisma intertextual que pretende auxiliar o leitor a interpretar, avaliar e utilizar mais eficazmente um respectivo material textual.

Numa última abordagem, de natureza mais prática e visando ao auxílio frente à categoria dos estudantes e dos escritores, mormente, Bazerman (2007) imprime ênfase ao que resolveu chamar de dimensões de intertextualidade, cada qual se servindo de menções aos usos, funções e usufrutos do texto diante de suas dadas demandas sociais. Percebem-se nesta instância teórica de análise, claramente, revisitações aos campos da semântica, do cotexto-contexto e, também, da retórica e do argumento, entre outros aspectos de relevância considerável ao entendimento da gama de conteúdos que abarcam a intertextualidade. 

Num indicativo teórico que defende a intertextualidade da escrita e da retórica como processos constituídos de eventos/fenômenos múltiplos e díspares, contíguos e unidos aos agenciamentos os mais contemporâneos possíveis das necessidades e oportunidades sociais e humanas, e tudo dentro de um compêndio complexo de textos historicamente evoluídos e em transformações contínuas, Bazerman (2007), confronta-se e é confrontado ao se definir em tais encaixes, sem deixar de enunciar que se faz deveras importante a busca pela autoridade textual no momento criativo, como se para nos redimir de quaisquer espectros de ilegitimidade de ordem existencial e/ou de legado.

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