domingo, 19 de junho de 2011

Os sentidos de Adão e Eva


Por Germano Xavier

o horizonte distante e a pressa em chegar, sentar, acender verdades sob a árvore, fez de Eva a resposta aos mundos dos sentidos. Adão se sujeitava a colher frutos dos produtos que não se juntam, oferecendo-se poema inteiro. mulher de café e antistamínico, borbulhava em roupas que mal cabiam a alma, sequer o coração acelerava sob o seio que emoldurava o corpo. o homem, formalizado, recordando-se a propósito, estimaria a falta de certeza. sem anteparos nem escolhos, continuava em admirações. presa de si e sustentada por anos e erros do passado, falava sozinha porque jamais entenderiam sua eficácia em transformar parábola em vocábulo simples. com as bochechas rosadas, o primogênito do pai aprendia que pecar era gostoso e que o melhor fruto é o fruto que não desnatura. o homem amava o pai, amava o próprio homem e amava a mulher do homem. se era tarde, era tarde e se fosse cedo, hora de dormir e comer mais sonhos sem as teses entrecortadas de Freud. nenhum psicanalista saberia da anatomia do amor nem da alma como a única criatura dos dois, que nasceu assim para ser assim. o que teria de tão espetacular e analístico em sonhar com escadas migratórias e pães açucarados? sonhos são castiçais, candelabros individuais. por que complicar se tudo já era disperso ( uma bola de neve no cerrado)? talvez por ser a vida uma caixinha de surpresa, ou um clube de carteado, com formigas e cigarros e bocas. ela pensava que o mundo se escondia embaixo de sua cama e sempre o mesmo inseto criaria casa, casca e certeza em seu abajour. a mulher arrepende-se, por ter ficado embaixo da cama durante toda a guerra e por perder o melhor da festa. o homem não sabia o quanto tudo aquilo soava verdadeiro. Eva tinha quarto, cama e abajour. um amor por segundo e o movimento dos sentidos era eterno. sua emancipação era carregar as chaves de casa. melhor é a língua tanta da língua, nossa tanta torre de babel. era sua a casa em que morava e também o inseto e a luminária azul - coisa de quem vive de antigos convites não aceitos. marca de batom, clara marca de si no pescoço do amor do minuto seguinte. ela não eternizava a vida. eternizava o beijo de sonho e Freud não saberia amar os seios de Eva como ela amava seus pensamentos noturnos. Adão, no final, que era só um iniciar, criou a teoria do amor. e a teoria resumia-se a um só item: amar com amor. tinha amor por si e - navegava em si - a nova egoísta dos segundos que vivia. o segundo era o amor. e o primeiro também.

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