Por Germano Xavier
XI
Não é de hoje que mantenho contato com os meus fantasmas. Apesar de estar aqui apenas de passagem, tenho tido profundas relações com meus espectros mais interiores e essenciais. Depois dessa, você deve estar a imaginar que não caibo na menor porção racional de qualquer ser humano esquizofrênico que, por uma via ou outra, constantemente fica a mercê dos navios estrangeiros que atracam durante a noite nestes portos sombrios. Portos dos disfarces.
Não, não pensem que eu sou um louco! Eu sou apenas uma criatura pseudestésica (já se esqueceu disso?!)... e que, apesar de tanto desprezo e desconsideração, segue acreditando na existência de “Mundos”. Há pouco tomei quase a metade de um “concentrado” que acabaram de lançar no mercado farmacêutico. Sabe como é, esta pós-modernidade de procriações e difusão de conhecimento em velocidades inenarráveis, que sempre deixa a própria espécie humana ainda mais perdida, presenteia-me neuroses...
Mas, voltando ao assunto...
Ah, os meus fantasmas!
Não era o do Fernando Sabino, mas não deixava de ser um encontro marcado. Isso, eram encontros marcados! E até hoje. Todo dia, quase sempre no mesmo horário, justamente após o primeiro despertar noturno. Eu já citei aqui, no texto de abertura desses relatos, que eu não consegui conjugar o verbo “dormir” durante toda a minha infância e adolescência. Quantas lembranças! Minha cabeça começa a doer só em imaginar pensamentos. Eu preciso da minha puçanga! Ultimamente, eu ando misturando alguns barbitúricos com ervas verdes que estou cultivando em minha pequena horta. Não suspeito aonde chego.
Sempre tive medo do escuro (esse sentimento vem diminuindo com o passar dos anos), e sempre tive o escuro como aliado. Quando cerrava os olhos durante a madrugada quase sempre fria da cidade onde eu nasci e morava, via sombras amorfas que atravessavam de lado a lado o vão do meu quarto. Pronto! Era hora de começar a transpirar, hora do coração pulsar freneticamente e de maneira desconjuntada, de levantar de súbito, escorando-me nas paredes, e hora de acender a lâmpada. E era sempre a mesma imagem. O meu irmão dormindo feito uma pedra no outro lado, nenhuma sombra, nenhum fantasma e eu, um garoto silente que não conseguia se encontrar. Talvez não fosse medo, mas sim uma vontade nata de enxergar as coisas como elas realmente deveriam ser, de exercer o papel fundamental da comunicação entre seres, sejam-os seres quaisquer, metafísicos ou reais. Talvez não fosse nada disso, mas a vontade de encontrar um amigo que me levasse para um lugar repleto de borboletas azuis e “pássaros coloridos”, bem longe. Isso eu bem queria, sempre quis.
Reminiscências eternas! E quantas!
Só restou a esperança, como sempre acontece depois que nos ocorre uma frustração. No meu caso, foi uma frustração de menino, feita de bolos confeitados e balas açucaradas, mas não deixavam de ser frustrações. Por vezes penso que os pais nem desconfiam, mas as crianças também sofrem com essas mascarras e falhas hodiernas, e acabam se tornando malogrados prematuros e indefesos (e é muito difícil encontrar psicotrópicos infantis).
Eu continuo o meu discurso: peguem as cordas! Vejam a liberdade! Eu sei da liberdade, eu sei! A liberdade está na corda! Eu sei de tudo que te fere. Acreditem em mim, acreditem! Eu não sou louco. Sou apenas um sonhador que acredita em “Mundos”. E não estou querendo criar confusão com nenhum de vocês.
O que eu quero é que vocês vivam, apenas isso.
E sirvam-se de seus pseudo-sumos, mas vivam!
Pai, perdoe a todos, pois eles não sabem o que fazem.
4 comentários:
Crédito da imagem:
"Fantasmas. by ~Phoenixjca"
Deviantart
orgulho de você.Uma menina.
Brilhante!
Bonito texto esse meu amigo!
Essa viagem ao, ou ... a um passado presente, é muito terna muito pessoal.
Gostei muito, pois afinal quem não teve também, ou ... quem não tem também, um ou outro fantasma, um ou outro medo por explicar. No entanto, tudo isso, todos estes medos,e fantasmas com os quais convivemos, dão muitas vezes o mote, para mais fortes prosseguir-mos esta nossa temporal caminhada.
Abraço, boa semana.
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