segunda-feira, 3 de junho de 2013

Senhoras e senhores, o imprevisto


Por Germano Xavier

De que materiais são feitos os imprevistos? Quais os elementos que os constituem? Podem, eles, quando trabalhados fervorosamente no âmbito da literatura, serem gerados sem que se precise usar de seus próprios ingredientes, ou realmente acontecem inesperadamente, sem suspeitarmos de quando virão à tona, tal qual estrelas cadentes no céu? O Imprevisto, antes de ser o título do livro de estréia no universo literário de Eulália Isabel Coelho, conhecida simplesmente por Biba, é também o elemento primordial da obra, e que permeia todos os dezoito contos do livro. Com menos ou mais intensidade nos diferentes temas abordados dentro dos respectivos escritos, percebe-se de pronto que é o não previsto o que causa espanto no leitor, o inopinado, o que se sucede de súbito, sem pedir permissão, ou melhor, é a surpresa que surpreende – assim mesmo, redundantemente. São contos curtos, escritos em tom intimista, geralmente intercalando a primeira pessoa com a figura de um narrador que dita as estórias em terceira pessoa, dando a impressão de que há sempre um misto de passado e presente, de realidade extrema e pura ficção. O leitor acaba sendo a terceira personagem dos textos, de função especialíssima e fundamental, pois se envereda, mesmo nos ambientes mais recônditos, por mundos deverasmente aprazíveis, quando não misteriosos. Aliás, a autora brinca com seriedade com uma forma de fantástico mais sutil, de linha tênue, sem espetacularizar muito. Nada parece forçado, nenhum acontecimento narrado soa como um exagero. Talvez por já saber que o que mais importa em um bom texto é a carga de sentidos que algo aparentemente normal pode revelar a um sujeito-leitor quando imbricado com outros fatores da trama. Com classe e paciência, Biba nos conduz a um simulado de real paralelo, muito mais visível e verossímil do que à primeira vista pode parecer. É assim em Arremedo, conto que abre o livro, quando nos mostra o convívio conflituoso de uma artesã com sua própria arte. Ou uma incursão nas arestas do escuro, em Cantiga. Ou, ainda, num mágico visualizar acerca das naturezas animais e humanas quando de um fato bastante intrínseco: a morte; na não revelação de um segredo, no ponto de vista de um alguém normal acerca do fator tempo, num conto-homenagem ao escritor Caio Fernando Abreu, entre tantos outros. E tudo isso sem deixar o leitor com a sensação de vazio, ou de plena satisfação, posto que é através dos inúmeros questionamentos deixados à vista de quem lê que a autora ousa criar raízes mais firmes e profundas para suas narrativas. Perguntas do tipo: “Deus é o único que dá uma curva no tempo, não é?”; “Você não quis preencher aquele vazio que ele encarcerava no olhar, não foi?; “Mas quem pode entender o inevitável?”; “Tudo é uma questão de momento, não é?” Assim a cadência que soa natural e harmônica da orquestra textual regida por Biba vai ganhando suas formas, suas cores, seus sons. O resultado final é, como propõe o título, uns algos ou alguéns não pensados regando as terras da razão e da fantasia.

Para ler mais, acesse:
www.bibacoelho.blogspot.com

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