quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Perguntas ao Pó (nº 2)


A entrevistada de hoje é Cláudia Lemos, que escreve em Controvento-desinventora.


O EQUADOR DAS COISAS - Quem é você?

CLÁUDIA LEMOS - Eu sou a conjunção de uma sexta-feira da paixão com uma terça-feira de carnaval. Defensora da liberdade. Força magma que escorre delicada, como uma lágrima inesperada diante de uma cena que gere em mim a indignidade. Sou o vento que despetala um campo de girassóis, preocupada em alimentar a fome de todos os Van Gogh(s), a fim de interferir na paisagem do mundo, construindo gente...sentindo-me humana. Eu sou o outro, sem deixar de ser eu mesma.

OEC – Por que você escreve?

CL - A escrita é o ar que respiro. Escrevo o tempo todo mentalmente sobre a paisagem em meus olhos, a cena intragável, a boca que beijo. Dentro de mim há textos que nunca escrevi, há uma estante vivida e, às vezes, versos submersos brotam poemas, parágrafos, contos... A verbalização é inusitada cabe em qualquer folha em branco, no blog, num papel de pão, na minha trincheira, que é a sala de aula, no quadro que já foi negro. Sou feita de palavras, que espalho ao vento.

OEC - O que é ser carioca?

CL - É um estado de espírito. Embora eu tenha nascido em Teresópolis (Região Serrana do Rio) pelo tempo que vivi na cidade “maravilhosa”, sinto-me carioca de alma e de gema. Há uma liberdade em Ser carioca, que transcende a violência, as dificuldades e o medo... Amo do Rio do Subúrbio do Trem ao Metrô da Zona Sul e não há quem resista a Rua do Lavradio, Pedra do Sal, Feijoada da Portela, Fla X Flu no Maraca, ensaio da Escravos da Mauá, Praia de Grumari, Restinga da Marambaia...Dá pra esquecer tiroteios, sequestro relâmpago, assaltos...apesar de tudo dá prá ser carioca. Além de tudo caminhar pelos textos de Machado de Assis, João do Rio, Heloísa Seixas...O rio é um livro aberto, em que o carioca pode ser personagem, leitor, escritor...

OEC - Ainda sonhas com algo que não realizou? Pode nos dizer?

CL - Sempre os sonhos, assim como a utopia eles nos movem. O mais louco é escrever poemas e trechos de textos, que fale do “ser humano” pelas ruas, viadutos, sinais de trânsito e que as pessoas em pelo se vestissem de poesia; o mais acadêmico seria ir à Itália fazer um curso com Umberto Eco...

OEC - O que é ser professor(a)?

CL - Um desafio em um país onde não se valoriza o profissional de educação, no entanto ainda defendo o espaço da sala de aula com autonomia, criatividade e amando o que faço, pois como já disse essa é a minha trincheira.

OEC - Dia D,de Drummond. Quem é Drummond para você?

CL - Um “gauche na vida” é o que Caetano define musicalmente como: “o avesso do avesso do avesso do avesso.” Um poeta à janela, observando o mundo parado, tendo convulsões poéticas e desejando sua Pasárgada-Itabira.

OEC - O que pensas sobre a violência no Brasil?

CL - Vivemos a violência evidente, mas todo tempo sofremos e cometemos a violência simbólica, usando, por exemplo, a falta de atitude, o desrespeito, imprimindo a desconfiança e desacreditando no ser humano. A violência começa em cada um de nós e só a partir de nós pode ser combatida.

OEC - O que anda lendo atualmente e do que se trata?

CL - Tenho a prática de leituras simultâneas e, neste momento, leio: “Instruções para Salvar o Mundo”, de Rosa Montero, uma fábula moderna, que insiste em provocar o leitor a responder: “Até onde você iria para recomeçar sua vida?” é um título que engana os desavisados, pois narra sobre dois homens muito diferentes entre si, que despertam toda noite de um mesmo pesadelo. O outro título que leio é “Eu Matei Sherazade: confissões de uma árabe enfurecida”, de Joumana Haddad, que este final de semana esteve no Rio e deu uma entrevista no Segundo Caderno do Globo sobre o livro em questão. A capa traz o seguinte comentário de Mario Vargas Llosa: “Um livro corajoso sobre uma mulher no mundo árabe. Ele abre nossos olhos, destrói preconceitos e é muito divertido”. Eu atesto que o que ele diz é verdade. Além destes, leio a biografia: “Clarice,”, escrita por Benjamim Moser, muito bem editado pela Cosacnaify, que mescla a biografia à bibliografia da adorável Clarice Lispector de maneira agradável, promovendo uma intimidade com a sua produção literária e revelando particularidades inéditas. Leio, também, as produções dos blogs que sigo, diariamente.

OEC- Astrologia funciona? Como?

CL - Como o astrolábio (instrumento astronômico) indicava o caminho aos navegantes e Fernando Pessoa diz: que “navegar é preciso”, para atravessar o mar da vida, escolhi o mapa astral, que revela o desenho do céu no momento em que nascemos. Se funciona? Não sei, mas acho extremamente poético: um poema feito de constelações.

OEC - Fale-nos algo sobre o blog O Equador das Coisas...

CL - É um blog que traduz o título: um ponto repleto de orbitais. É um diferencial pelas propostas, pelo talento do autor e pela versatilidade, que promove o movimento de todas “as coisas” nessa linha imaginária, equatorial e poética. Fico feliz em saber que existem escritores que escrevem com esta qualidade literária como você.

2 comentários:

controvento-desinventora disse...

Obrigada, Germano, pela honra de participar do Equador de Coisas, podendo falar do quanto é importante a dinâmica deste blog para os seus seguidores.

Parabéns pela iniciativa e originalidade.

Dani Gama disse...

Que maravilha é conhecer pessoas de outros lugares com o gosto apurado pela boa literatura. Bom conhecer aqui uma carioca que, como eu, tambem é professora e defende esse tesouro a que chamamos educar. E, Claudia...eu sou apaixonada pelo seu Rio turbulento e inigualavelmente lindo!

Germano Xavier, um beijo doce em seu coração.