sábado, 19 de abril de 2014

Praticando o ensino da Língua Portuguesa


Por Germano Xavier

A língua materna é algo tão íntimo, tão indissociável do usuário, que faz com que a pessoa veja, crie, recrie o mundo em sua volta, sempre olhando pelo ângulo de seu idioma. Expliquemos melhor. Logo após a concepção, tudo que nos é dirigido, por meio de palavras, vem em nossa língua mãe, o Português. Daí, podermos afirmar que o Português é nossa língua materna, isso porque nós o escutamos deste o ventre de nossas mães. Somos lusófonos antes mesmo de nos percebermos como pessoas. Diga-se de passagem que até nossa percepção como seres humanos, cidadãos acontece pela vertente da Língua Portuguesa.

Em nossas famílias, bairro, comunidades religiosas, grupos em que somos inseridos desde nossa tênue infância, permitem-nos perceber, participar, transformar situações, idéias, sentimentos em Língua Portuguesa. A nossa personalidade é formada em Língua Portuguesa; a nossa dignidade de seres humanos é respeitada ou ferida em Língua Portuguesa.

Portanto, podemos afirmar categoricamente que somos usuários, dominadores autênticos do Português, independente de qual variação utilizamos, independente do domínio técnico que detemos. Assim, por meio desta pesquisa, buscamos detectar as reais dificuldades encontradas em sala de aula de um colégio estadual da cidade de Petrolina – PE em relação ao ensino de Português diante das variações lingüísticas. Os sujeitos desta pesquisa foram os(as) professores(as), por se tratarem das pessoas que estão mais engajadas no processo de ensino de Língua Portuguesa e que têm o conhecimento técnico necessário para analisar por uma ótica de criticidade a prática do ensino de Português no colégio pesquisado.

Ressaltamos, que os resultados alcançados nesta pesquisa não tiveram o propósito de definir metodologias para a prática do ensino de Português em sala de aula. Contudo, os resultados obtidos poderão contribuir para uma efetiva e democrática discussão do modo como vem ocorrendo em sala de aula o ensino de Língua Portuguesa, bem como, poderão a vir ocorrer, posto que detectar quais dificuldades são percebidas por professores(as) de Português no tocante ao ensino da língua diante das variações lingüísticas presentes em sala de aula, Identificando a(s) metodologia empregada(s) nas aulas de Língua Portuguesa no colégio pesquisado; averiguando como acontece a convivência entre a variação lingüística padrão e as diferentes variações não-padrão trazidas pelos alunos de casa; percebendo possíveis erros e contradições na(s) metodologia(s) empregada(s) por professores(as) de Língua Portuguesa no colégio pesquisado, abrimos novos caminhos para um progresso sociolingüístico em todas as esferas da sociedade e do conhecimento.

A IMPORTÂNCIA DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA

“Brasil: país da miscigenação”. Essa frase é muito conhecida, tanto por brasileiros como por aqueles que são estrangeiros mas que têm interesse por nosso país. Afinal, essa miscigenação vem de longas datas, desde quando os portugueses aqui chegaram, e a partir daí só deu continuidade a sua proliferação.

Se todos conhecem que a origem do Brasil se deu pela mistura de raças e culturas, por que querer estabelecer a variante da língua padrão como única correta? Por que querer impor que quem fala diferente da norma-padrão fala errado? A miscigenação também está presente em nossa língua, não falamos de uma única forma, há uma mistura, são várias as maneiras possíveis de nós nos comunicarmos.

É tão certo que a nossa língua materna é o português quanto que as pessoas que aqui nascem são brasileiras. Mas daí querer que todos os brasileiros nasçam com a mesma cor de pele, com as mesmas características quanto a cabelo, olhos, narizes... É impossível! Da mesma forma é com a língua. Querer que todos falem a língua portuguesa sem variação é impossível. Mesmo porque cada um se encontra em um contexto sociocultural e econômico específico.

VARIANTES PRESENTES NA LÍNGUA

As variações lingüísticas estão presentes na nossa língua. Basta começarmos a passear pelos estados do Brasil para percebermos tal realidade. Comecemos pelo estado de São Paulo, lá observaremos que se destaca o uso do R, eles falam “poerta”, “poertão”. Já no Rio, destaca-se o uso do tch, ao invés de falar titia, eles falam tchitchia. Na Bahia, por sua vez, o falar manso e palavras no diminutivo, a exemplo de painho e mainha, são características marcantes daquele estado. Em Minas Gerais, encontramos palavras com terminações na vogal I, como meninim, ao invés de menino. Não será preciso analisar cada estado porque as variações estão presentes em todos eles de forma bem ampla, onde cada um fala de maneira particular. Assim, podemos afirmar que não é porque os paulistas falam “poerta” que estão certos e os falantes de outros estados estão errados. Todos estão corretos, embora falem de maneira diferente.

Bagno(2008, p.68, grifo do autor), enfatiza essa afirmação:

Ora, todos estão igualmente certos. O que acontece é que em toda comunidade lingüística do mundo existe um fenômeno chamado variação, isto é, nenhuma língua é falada do mesmo jeito em todos os lugares, assim como nem todas as pessoas falam a própria língua de modo idêntico o tempo todo.

Ficou claro, pelas palavras de Bagno, que não existe uma única forma de usarmos a língua, cada um tem um modo diferente de se comunicar.

Portanto, não é preciso irmos a vários estados brasileiros para notarmos a presença de variedades lingüísticas, pois, até em uma mesma cidade notamos a presença de vários dialetos. O que mais determina o uso dessas variações é a ocasião e a quem estamos nos reportando, por exemplo, numa conversa entre amigos, é comum usar uma linguagem mais informal, já numa ocasião onde o uso formal da língua é exigido, essa linguagem deve ser evitada.

AS VARIANTES DE ACORDO COM OS ESTADOS SOCIOCULTURAL E SOCIOECONÔMICO

Em nosso país há uma grande riqueza cultural. O Brasil foi formado pela miscigenação das raças indígena, negra e branca, e dessa mistura, absorvemos características fortes de cada uma delas, que são transmitidas de geração a geração. Ora, uma vez que os estados brasileiros sofrem influências diferentes dos grupos étnicos, podemos afirmar que o Brasil tem uma pluralidade cultural maravilhosa. Com a chegada dos colonizadores, os índios, que já habitavam essas terras, foram forçados a trabalhos escravos, logo após vieram os escravos negros.

Bem, essa recapitulação servirá para refletirmos sobre a nossa sociedade atual, pois, infelizmente, ainda há um grande preconceito sociocultural sobre esses dois grupos. Notamos que grupos de pessoas fazem uma classificação pejorativa de culturas, crenças, rituais, modos de vestir, dialetos, agindo assim de forma preconceituosa. Porém, devemos nos perguntar: como podemos classificar uma cultura como superior ou inferior? Quais os critérios que são adotados? Qual a referência entre elas para que possamos dizer se é melhor ou pior?

Em resposta a primeira pergunta, daremos como resposta uma citação de Soares(2000, p.38-39):

A Antropologia já demonstrou que não se pode considerar uma cultura superior ou inferior a outra: cada uma tem a sua integridade própria, o seu próprio sistema de valores e de costumes; não há culturas “simples” ou “complexas”, “pré-lógicas” ou “lógicas”.

Portanto, não existem culturas superiores, nem inferiores, existem diferentes. Tenhamos nosso país como exemplo, foi colonizado pelos portugueses, mas nossa cultura é diferente de Portugal, seja na maneira de se vestir, de agir, as crenças, os valores, ou seja, temos padrões culturais distintos. Não somos nem inferiores e nem superiores aos portugueses, somos apenas diferentes.

Assim também explica a sociolingüística, em nosso país falamos a língua dos nossos colonizadores, a Língua Portuguesa, porém aqui não é falado do mesmo jeito que em Portugal, inclusive como já dissemos anteriormente, uma mesma língua sofre variações até mesmo pelos falantes de uma mesma comunidade lingüística. Não devemos então achar que em uma região se fala melhor o Português do que em outra, uma vez que há apenas diferença no modo de fala de cada região.

Diante de tanta diversidade cultural, cresce o preconceito sobre as camadas menos favorecidas econômica, social e culturalmente, e isso reflete também no campo da Lingüística, onde em nosso país, principalmente, nas regiões norte/nordeste há o preconceito lingüístico, daqueles que se dizem usuários da norma-culta da Língua Portuguesa. Esses ainda vão além, pois afirmam que toda forma de uso da língua que está fora das normas da gramática normativa é “erro de português”.


NÃO HÁ “ERROS” NA LINGUAGEM

O que são esses “erros de português” de que tanto falam os gramáticos? Uma língua viva nunca é estática, ou seja, sofre modificações no decorrer do tempo, ou melhor dizendo, evolui. Para enfatizar essa afirmação usaremos como exemplo o pronome de tratamento você: Antes era “Vossa Mercê”, passou a vosmecê> você> e hoje já percebemos a forma ocê, vc ou apenas cê no uso da forma menos formal da fala.

Ainda falando dessa dinamicidade da língua, Bagno faz um interessante comparativo entre língua e gramática normativa, comparando o primeiro objeto a um rio caudaloso e o segundo a um simples igapó da Amazônia.

Em suas palavras,

Na Amazônia, igapó é um trecho de mata inundada, uma grande poça de água estagnada às margens de um rio, sobretudo depois da cheia. Me parece uma boa imagem para a gramática normativa. Enquanto a língua é um rio caudaloso, longo e largo, que nunca se detém em seu curso, a gramática normativa é apenas um igapó, uma grande poça de água parada, um charco, um brejo, um terreno alagadiço, à margem da língua. Enquanto a água do rio/língua, por estar em movimento, se renova incessantemente, a água do igapó/gramática normativa envelhece e só se renova quando vier a próxima cheia. (2008, p.20, grifos do autor).

É necessário pensar que a língua é feita para os seus falantes e esses é que irão determinar o seu uso. Devemos fazer então uma separação entre língua e gramática normativa, pois somente dessa forma poderemos evitar a exclusão que fazem àqueles que usam uma variante lingüística diferente da norma-padrão, ditada pela gramática tradicional.

É difícil, ou melhor dizendo, é impossível que num país tão grande em extensão como o Brasil, todos falem da mesma maneira, como assim querem os gramáticos. Isso acontece porque cada indivíduo vai desenvolver uma gramática internalizada de acordo com o meio em que vivem e socializam. Assim sendo, não é possível conceber a idéia de que eles falem errado, mas, que há apenas um uso diversificado da língua, diferente das normas impostas pela gramática tradicional, sobre isso Bagno (2008,p. 51) diz que “Saber uma língua, na concepção científica da lingüística moderna, significa conhecer intuitivamente e empregar com facilidade e naturalidade as regras básicas de funcionamento dela.”

Da mesma forma podemos dizer que erros de ortografia, não são o mesmo que “erros de português”.

Imaginemos então o que aconteceria com uma criança que se desloca de uma cidade do nordeste para estudar em uma cidade do eixo Sul/Sudeste; certamente sofrerá muitos preconceitos em relação ao seu modo de falar, e isso pode trazer conseqüências muito sérias em relação ao seu aprendizado e no seu desenvolvimento intelectual. Ela poderá por diversas vezes, se calar, mesmo tendo dúvidas em relação ao conteúdo abordado em sala de aula, pois poderá sentir-se constrangida e inferiorizada em relação aos seus colegas de classe.

Concebendo a língua dessa forma, cheia de preconceitos e de noções de erros, daqueles que usam variantes diferentes da norma-culta, estaremos criando uma barreira muito difícil de ser ultrapassada pelos falantes dessa língua.

O ENSINO DA LÍNGUA

Os alunos ao ingressarem nas escolas, trazem consigo a sua linguagem aprendida em família, caso ela, a língua, não seja aceita em sala, a professora terá conseguido inibir os alunos, reprimi-los e penalizá-los o suficiente para transformar aquelas crianças tagarelas de casa em crianças “mudas” na escola.

Bortoni-Ricardo nos exemplifica essa situação de forma divina ao nos reportarmos ao trecho do livro Rememórias Dois, esse de Carmo Bernardes, vejamos:

Entrei numa lida muito dificultosa. Martírio sem fim o não entender nadinha do que vinha nos livros e do que o mestre Frederico falava. Estranheza colosso me cegava e me punha tonto. Acho bem que foi desse tempo o mal que me acompanha até hoje de ser recanteado e meio mocorongo. Com os meus em casa, conversava por trinta, tinha ladineza e entendimento. Na rua e na escola – nada; era completamente afrásico.(2004, p.13).

Nesse trecho, Bernardes narra sua experiência em seus primeiros dias de aula, experiência essa que tem sido de muitas outras crianças, por vergonha, inibição do seu dialeto, comportam-se como tagarelas em casa porém recanteadas e tímidas na sala e o pior é que essa inibição, a maioria das vezes, é desencadeada pelo professor, e auxiliada por alguns alunos e funcionários, o que faz com que várias crianças acabem desistindo ou sendo desestimuladas a estudar.

Bordoni-Ricardo( 2004, Pág. 25), relata um episódio que aconteceu com sua, colega analisemos:

Ela se lembra de um grande constrangimento em sua infância, quando, recém-chegada da zona rural da Paraíba, apontou para uma palavra no quadro-de-giz e perguntou a professora: “Que palavra é aquela lá em riba?” Ao ouvir isso, a professora a ridicularizou em frente dos colegas.

Constrangimentos desse tipo, afetam tanto o aprendizado como o psicológico da criança, mesmo depois de tanto tempo essa professora ainda lembra do episódio com detalhes, só a partir dessa informação percebemos o quanto a afetou emocionalmente.

É preciso repensar o método com que os professores lidam com os alunos quanto às variantes que estes usam em sala de aula. Talvez aí venha a dúvida. E então vai deixar a aluna falando em riba? Diante de questões como essas é que professores ficam apáticos, inseguros sem saber de que forma reagir aos tão famosos “erros de português”.

Vejamos o resultado de uma pesquisa feita por Bortoni-Ricardo sobre a conduta do professor perante a realização de uma regra lingüística não-padrão pelos alunos:

• O professor identifica “erros de leitura”, isto é, erros na decodificação do material que está sendo lido, mas não faz distinção entre diferenças dialetais e erros de decodificação na leitura, tratando-os todos da mesma forma;

• O professor não percebe uso de regras não-padrão. Isto se dá por duas razões: ou o professor não está atento ou o professor não identifica naquela regra uma transgressão porque ele próprio a tem em seu repertório. A regra é, pois, “invisível” para ele;

• O professor percebe o uso de regras não-padrão e prefere não intervir para não constranger o aluno;

O professor percebe o uso de regras não-padrão, não intervém, e apresenta, logo em seguida, o modelo da variante-padrão.(2004, p.38).

Diante de tal postura do professor perante essa situação, a mesma autora recomenda,

Da perspectiva de uma pedagogia culturalmente sensível aos saberes dos alunos, podemos dizer que, diante da realização de uma regra não-padrão pelo aluno, a estratégia da professora deve incluir dois componentes: a identificação da diferença e a conscientização da diferença. (2004, p.42, grifos da autora).

Retomando a questão citada: ‘”E então, vai deixar a aluna falando em riba?” Após observarmos a citação de Bordoni-Ricardo, diríamos: E por que não? Não é a sua linguagem? Não conseguimos entender, mas deixá-la com apenas esse vocabulário é que não é interessante, é preciso ampliá-lo e não menosprezar o que já tem.

Pois a linguagem é como um guarda-roupa, é preciso saber usar as roupas de acordo com a ocasião. Não é por que vamos a uma festa, que será preciso usar sport fino, que iremos jogar todas as nossas roupas jeans no lixo. Pode ser que precisemos do jeans para o dia seguinte; para irmos a um piquenique. Assim é a linguagem, a criança vem com a sua de casa, com suas variações de acordo com o seu status social e cultural; e a professora precisa apenas apresentar outras variações lingüísticas sem classificações extremistas, como certo ou errado.

TIPO DE PESQUISA

Esta pesquisa foi do tipo descritiva, desenvolvendo-se numa abordagem qualitativa, analisando a prática do ensino de Língua Portuguesa diante das variações lingüísticas presentes em sala de aula dos Ensinos Fundamental e Médio de um colégio público estadual do município de Petrolina – PE.

SUJEITOS DA PESQUISA

Professores(as) de Língua Portuguesa de um colégio público estadual da cidade de Petrolina – PE. Foram entrevistados(as) professores(as) que ministram aulas de Língua Portuguesa no colégio pesquisado.

Os sujeitos desta pesquisa foram escolhidos por fazerem parte da rede de ensino mais ampla e complexa - a rede estadual de ensino -, esta dotada de maiores estruturas físicas, material humano e recursos orçamentários.

DESCRIÇÃO DOS INSTRUMENTOS

Foram elaborados questionários constituídos por indagações objetivas e subjetivas pertinentes ao ensino de Língua Portuguesa. Tais questionários foram respondidos por professores(as) que fizeram parte desta pesquisa e serviram para fornecer subsídios que permitiram verificar a prática do ensino de Língua Portuguesa diante as variações lingüísticas presentes em sala de aula do colégio pesquisado.

APLICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS

Os questionários foram respondidos de forma escrita pelos(as) pesquisados(as), e os pesquisadores utilizaram-se do método da observação, objetivando captar subsídios que pudessem contribuir para um melhor êxito da pesquisa.

LEVANTAMENTO DOS DADOS

As respostas dadas pelos(as) pesquisados(as) foram analisadas pelos pesquisadores e transcritas de forma direta ou parafraseada em texto oportuno.

TRATAMENTO DOS DADOS

Os dados obtidos por meio dos questionários, respondidos por cada pesquisado(a), deram margem a interpretações concernentes à prática do ensino de Língua Portuguesa diante as variações presentes em sala de aula dos Ensinos Fundamental e Médio de um colégio público estadual da cidade de Petrolina – PE no ano letivo de 2008. Os questionamentos foram elaborados para que demonstrassem a verdadeira prática do ensino de Língua Portuguesa diante as variações lingüísticas presente em sala de aula do colégio pesquisado.

MÉTODO DE PESQUISA

Esta pesquisa foi realizada utilizando-se o método dedutivo. Com 100% (cem por cento) dos(as) professores(as) de Língua Portuguesa dos Ensinos Fundamental e Médio do colégio pesquisado, fazendo-se a combinação dos dados levantados em sentido interpretativo, isto é, por meio da dedução, caminhando do geral para o particular.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Neste momento, temos como prioridade fazer a apresentação e a análise dos dados colhidos na pesquisa DIFICULDADES COM RELAÇÃO AO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA DIANTE DAS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS PRESENTES EM SALA DE AULA. Num primeiro momento, relataremos todo o ocorrido nos processos de preparação e de pesquisa propriamente dita. Feito isso, seguiremos com a descrição do questionário destinado aos entrevistados, seguida de uma explicação do porquê de cada pergunta, para depois apresentarmos e analisarmos as respostas colhidas no desenrolar da pesquisa. Por fim, numa conclusão bem sintetizada, relataremos acerca de tudo que foi observado.

CAMINHO PERCORRIDO PARA A REALIZAÇÃO DA PESQUISA

Na sexta-feira, 14 de novembro de 2008, dirigimo-nos à escola escolhida para o desenvolvimento da pesquisa, com o objetivo de apresentarmos à direção da mesma o Projeto de Pesquisa e pedirmos autorização para a aplicação dos questionários. Nesta ocasião, pela tarde e, também, pela noite, foi realizada a pesquisa junto ao professorado. Fomos cordialmente recebidos pela coordenação pedagógica, que deu a devida permissão para a realização da pesquisa, além de dar informações pertinentes aos professores do quadro da escola que ministram aulas de Língua Portuguesa. Os professores por nós procurados não se opuseram a colaborar na resolução do questionário. Todo o processo, incluindo aplicação e recebimento do material, deu-se em poucos minutos, tanto no turno matutino, vespertino e, de igual maneira, no noturno. Nenhuma das aplicações de questionário extrapolou 1 (uma) hora de duração.

Para a confecção e obtenção dos dados necessários, fez-se necessário irmos à escola no curso dos três turnos: matutino, vespertino e noturno. Em todas as ocasiões de visita, preocupamo-nos em procurar cada professor de Língua Portuguesa presente nos respectivos turnos. Ao todo, formaram a lista de professores pesquisados 5 (cinco) professores de Língua Portuguesa, que ministram aula de Língua Portuguesa na escola pesquisada e dão aulas em turnos diferentes. Destes, todos aceitaram participar da pesquisa. Contudo, pediram para responder ao questionário somente no momento do intervalo entre as aulas, pois os alunos se mantinham muito inquietos enquanto os professores tentavam responder às perguntas.

No período da manhã estivemos nas dependências da escola pesquisada entre 9h40min e 10h40min. No período matutino, foram entrevistados 3 (três) professores. Retornamos no período da tarde, onde entrevistamos mais 1(um) professor. Este pesquisado respondeu ao questionário entre 16h e 16h18min e nos atendeu com muito boa vontade.

Dos 5 (cinco) professores que fizeram parte da pesquisa, os cinco (cinco) são do sexo feminino. Cada professora pesquisada só ministra aulas na referida escola durante os turnos em que foram lá encontradas. O trabalho de pesquisa no turno matutino foi realizado entre 09h40min e 10h40min. A pesquisa no turno vespertino foi feita entre 16h e 16h18min. Já a pesquisa no turno noturno foi realizada entre 18h e 18h20min, do dia 14 de novembro de 2008.

A cada professor entrevistado dirigimo-nos com muita cordialidade e respeito. Agradecemos a eles por terem aceitado participar da pesquisa, fizemos uma apresentação pessoal e do projeto e pedimos para todos assinarem o protocolo de ética, este foi explicado e dado para todos lerem o seu conteúdo. Faz-se necessário destacar que, apesar dos poucos minutos diante das perguntas do questionário, passamos, literalmente, o tempo integral de aulas para efetivarmos a concretização da pesquisa, fato que nos deixou cansados, devido às repetidas idas e vindas ao estabelecimento de ensino. Algumas professoras demonstraram que não estão a todo o momento ligadas ao livro didático, outras se apresentaram como modos mais “saussurianos” de atuar em sala. Uma professora precisou levar o questionário para a sala de aula, no intuito de respondê-lo totalmente.

DESCRIÇÃO DO QUESTIONÁRIO E JUSTIFICATIVA DAS QUESTÕES

Um questionário foi produzido para ajudar na efetivação da pesquisa, destinado e aplicado junto aos professores. O questionário direcionado aos professores foi composto de 7 (sete) questões abertas. Todas as questões foram respondidas espontaneamente e as respostas foram escritas de próprio punho pelos pesquisados.

A primeira pergunta do questionário direcionado aos docentes em Língua Portuguesa da escola pesquisada pretendeu captar a informação acerca do tempo de experiência de cada professor no trabalho com a citada disciplina em sala de aula. O segundo questionamento averiguou a formação do professorado, o local de sua graduação e suas possíveis especializações. A terceira proposição procurou saber se o professor ministrava aula em outra rede de ensino, que não da rede de ensino do Estado de Pernambuco. A quarta questão pediu uma descrição, por parte do professor, acerca dos preparativos necessários para o bom desempenho de uma aula que tem como ponto central os temas “variante-padrão e variantes lingüísticas trazidas pelos alunos da sua própria casa”. Na quinta provocação, ainda com base na questão anterior, requisitamos uma descrição relativa à realização da aula preparada e descrita no item anterior. A sexta questão buscou extrair do professor uma visão acerca da idéia que o alunado possui concernente às variantes lingüísticas diferentes da tida como padrão. A sétima e última pergunta quis observar no professor se ele, como objeto analisado, teria alguma consideração a mais para fazer, tendo em vista as temáticas por nós pesquisadas.

RESPOSTAS DADAS PELAS PROFESSORAS PESQUISADAS

Em resposta ao primeiro questionamento, apresentado às pesquisadas, a primeira professora a responder disse ter quinze (15) anos de experiência como professora de Língua Portuguesa. A segunda professora afirmou ter oito (8) anos. A terceira pesquisada disse ministrar aulas de Língua Portuguesa há vinte e seis (26) anos. A quarta há vinte e dois (22) anos. E, por último, a quinta disse ensinar Língua Portuguesa há dezenove (19) anos.

Quanto ao segundo questionamento, todas as professoras perguntadas disseram ser graduadas em Letras pela Universidade de Pernambuco. Destas duas têm especialização em Língua Portuguesa e uma terceira está fazendo especialização em Lingüística e o Ensino de Português.

Quanto ao terceiro questionamento, dirigido às professoras pesquisadas, três professoras disseram que não trabalham em outra rede de ensino. Uma outra afirmou que também leciona na rede municipal de ensino de Petrolina e outra, por sua vez, disse que também ministra aulas de Língua Portuguesa na rede estadual de ensino do Estado da Bahia.

Em resposta ao quarto questionamento dirigido às professoras pesquisadas, a primeira disse: “A preparação dá-se de forma a preparar o aluno com a variante padrão, mas respeitando suas variações lingüísticas, ou seja, seus conhecimentos fora da escola”. A segunda respondeu: “Pesquisas de músicas. Pesquisa de regionalismo, gírias, etc”. A terceira entrevistada deu como resposta: “Através das gramáticas normativas, livros didáticos, músicas e pesquisas em geral”. A quarta respondeu: “Através de livros didáticos, textos jornalísticos e revistas”. Já a quinta entrevistada, escreveu: “Aproveitando falares próprios dos alunos em ocasiões discursivas anteriores ou textos, passarei a refletir sobre aspectos relevantes como: respeitar as falas como a necessidade de conhecer a variante culta ou padrão”.

A quinta pergunta, dirigida às pesquisadas, foi respondida assim pela primeira: “Com o surgimento das variações lingüísticas, procuro mostrar para o aluno, sem constrangimento, a variante padrão”. Em tópicos, a segunda respondeu: “Problematização sobre o tema. Leitura de diferentes textos. Observações. Testemunhos. Atividades”. E a terceira pesquisada disse: “Socialização dos textos escolhidos, observações dos mesmos e desenvolvimento de atividades em grupo e/ou individual”. A quarta pesquisada respondeu: “Produção de dissertações, onde o aluno possa desenvolver suas idéias mostrando assim os seus conhecimentos”. A quinta e última relatou: “Creio já ter respondido”.

Em relação ao sexto questionamento, a primeira das pesquisadas respondeu que “Ainda está em suas cabeças a divisão, mas a gente tenta valorizar o que ele já tem no seu dia a dia, sem esquecer de mostrar a padrão”. A segunda disse: “Os alunos acham interessante, um país tão diversificado”. A terceira deu como resposta: “Eles percebem claramente esta variação, respeitando-a”. A quarta insinuou: “Interessante, já que apesar de existir diferentes “formas” de comunicação o entendimento está presente em todas”. A quinta revelou: “Eles criticam como erros de português, mesmo nas reflexões de falares seus ou de sua região, entretanto falando e criticando os outros”.

Para o preenchimento da sétima e última questão, recebemos como resposta, seguindo as respectivas ordens de fala, o que segue: 1- “Respeitar o que o aluno traz”. 2- “O tema é muito bom, pois faz parte da nossa vida”. 3- “O tema abordado é propício, pois o Brasil é um país muito rico em variações lingüísticas”. 4- “O tema citado é importante já que aborda questões da própria comunicação social. Além de que o compartilhamento de conhecimento entre professor/aluno ajuda ambas as partes”. 5- “Acredito que todos nós, estudantes da língua portuguesa, temos um certo preconceito lingüístico e até então não encontramos a forma mais adequada para trabalhar esse tema em sala”.

ANÁLISE DOS DADOS COLHIDOS DE PROFESSORAS E ALUNOS

Das respostas dadas pelas professoras envolvidas na pesquisa, quanto ao primeiro questionamento, dirigido a elas, percebemos que as mesmas possuem vasta experiência na prática educativa de Literatura de Língua Portuguesa, em média 18 (dezoito) anos.

Quanto ao segundo questionamento, pudemos concluir que a formação das mesmas é boa, pois todas têm formação superior em Letras e, destas, 1 (uma) possui especialização concluída e 1 (uma) com a especialização em curso.

Quanto ao terceiro questionamento, todas foram claras ao apontarem suas respectivas funções em outras redes de ensino, sendo que apenas duas trabalham em outra rede.

Em relação ao quarto questionamento, observa-se que as pesquisadas, mais uma vez não se esquivaram da pergunta, umas mais sintéticas que outras, deixando perceptível o grau de aproximação das mesmas com o tema pesquisado.

Quanto ao quinto questionamento, e tendo em vista a resolução dada à quarta questão, confirma-se o caráter gradativo de apreço perante o tema abordado, revelando uma dissonância no que concerne à manipulação devida ou indevida da temática em questão.

As pesquisadas responderam ao sexto questionamento, denunciando que todas agem de forma tradicionalista, dando a entender que corroboram e intensificam o ensino da variante-padrão da língua. Todavia, ao mesmo passo, algumas perceberam o quão importante é trabalhar a diversidade da língua dentro da sala de aula, mostrando-se realmente preocupadas.

Na sétima questão, as considerações atribuídas pelas professoras centraram-se no respeito à bagagem linguística que o aluno traz de fora da escola e na importância de se mostrar, também, a variante-padrão da língua portuguesa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A língua, acima de tudo, é um elemento de inserção social, capaz de transformar uma dada humanidade, uma respectiva ordem, uma entidade dotada de um valor estritamente concreto e apalpável, perceptível, dona de uma vivacidade que muito bem poder-se-ia ser equiparada ao próprio ser que a utiliza. Diante disso, faz-se necessário desmistificar diversos mitos referentes às variantes lingüísticas e suas aptidões-valores, quase todas ainda vivas – e bem vivas, pasmem! – em nossa sociedade.

E fazer com que a língua, mecanismo que deveria funcionar para um bem geral, facilitando ações, produzindo interferências positivas, não termine dividindo opiniões, afastando pessoas, segregando valores, enraizada por um modelo de preconceito sutil e traiçoeiro que fragiliza a língua, dando-a um caráter dificultoso, de inacessibilidade, visto que conceitualiza e classifica o “utilizante” da língua a partir da escolha entre a norma culta ou não, criando uma perspectiva de fracasso e/ou sucesso nas pessoas.

Desconstruir a noção desse preconceito, “pondo a culpa” em peças importantes de todo o processo, como o analfabetismo, nossa escassa leitura, entre outras tantas, talvez seja o início de um caminho mais brilhante daqui pela frente, como afirma Marcos Bagno. Reiterar também a relevância das mudanças de atitudes por parte dos que usam a língua, apertando o cerco aos profissionais da língua materna e seus métodos pedagógicos de partilhamento do conhecimento faz-se de extrema necessidade.

Assim, foi com o intuito de detectar como eram vivenciadas as variações lingüísticas em sala de aula que desenvolvemos esta pesquisa.

Na qual concluímos que:

a) A concepção acerca das variações e da flexibilidade da Língua Portuguesa ainda é fortemente tradicional;

b) Os educadores estão procurando integrar e se preocupar mais com o desenvolvimento de um respeito pelas diversas variantes, fazendo com que o aluno saiba e possa a utilizar seu idioma de uma maneira mais ampla e positiva.

REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. Preconceito Lingüístico: O que é como se faz. 50. ed. São Paulo: Loyola, 2008.

Bortoni-Ricardo, Stella Maris. Educação em Língua Materna: A Sociolingüística na sala de aula. 1. ed. São Paulo: Parábola, 2004.

SOARES, Magda. Linguagem e Escola: Uma perspectiva social. 17. ed. São Paulo: Ática, 2000

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