domingo, 1 de julho de 2012

Hábito de ler e sociedade fast-food



 Por Germano Xavier

“Um país se faz com homens e livros”. Deste modo escreveu Monteiro Lobato, autor da saga do Sítio do Pica-Pau Amarelo e tantos outros clássicos da literatura tupiniquim, relatando a importância e o papel social-transformador do simples ato de debruçar os olhos sobre as páginas de um livro. O ato de ler é essencial à vida e a qualquer área do conhecimento, desde viabilizar a inserção social até possibilitar o desenvolvimento cognitivo do ser humano. A prática ou não da leitura reflete diretamente na vida de cada indivíduo. “Ler é transformar, revolucionar, transgredir”, explica o pedagogo formado pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Edeil Reis do Espírito Santo.

O Brasil, assim como a maioria dos países em desenvolvimento, possui uma tradição de leitura fundamentalmente elitista. No nordeste, as consequências negativas provenientes de tal costume são ainda mais comprometedoras. “Enquanto o governo insiste em exaltar números fantásticos concernentes à redução da taxa de analfabetismo no território nacional, estima-se que 60% da população brasileira é composta por analfabetos funcionais, o que quer dizer que aproximadamente 115 milhões de pessoas não adquiriram a capacidade de compreender o que lêem”, acentua Francisco de Assis, professor de Leitura e Produção no campus de Petrolina da Universidade de Pernambuco (UPE). Chiquinho, como é mais conhecido no ambiente acadêmico, diz que, com isso, multiplicam-se as críticas à metodologia usada pelos educadores durante a formação do aluno-leitor. A professora do ensino fundamental da cidade baiana de Juazeiro, Daise Magnólia, diz ser essencial encaminhar o aluno para além da decodificação dos códigos lingüísticos, aumentar a sua experiência de leitura, fazendo com que ele possa decifrar o que está subentendido no texto e, principalmente, fazer com que a criança ou o adolescente desenvolva a consciência da função social desse ato.

Para que esta mudança de postura seja devidamente efetivada, faz-se necessário a procura por novos métodos de incentivo à leitura por parte das instituições de ensino e educadores. De acordo com Maria Terezinha, professora da Escola Recanto do Pequeno Príncipe, o objetivo atual do professor das séries iniciais não é o de alfabetizar apenas, mas também de encurtar o caminho de cada criança em direção ao letramento. “Estamos trabalhando a partir da linha de pensamento da psicogênese da língua escrita, na qual é considerado que cada aluno já traz consigo, ao chegar à escola, algum saber sobre a construção da escrita, ação conseqüente ao ato de ler. Tudo isso no intuito de entender o contexto em que cada estudante está inserido, sempre percebendo a heterogeneidade das classes, e assim poder dizer a eles que os atos de ler e escrever possuem uma finalidade em si, ou seja, encerram uma espécie de recompensa”, assegura.

Os professores perceberam, também, a importância de se trabalhar com uma maior variedade de tipos textuais, assim como elevar o tempo destinado à leitura, para fazer com que se desenvolvam comportamentos leitores e escritores no corpo discente. “É claro que a responsabilidade maior fica a cargo do professorado, posto que são o espelho e a referência, porém é fundamental admitir que o auxílio dos pais deve ser incondicional no desempenhar da missão de incentivadores”, conta a educadora.

“É dentro de casa, vendo o exemplo dos pais ou dos parentes mais próximos, que as crianças irão começar a ter interesse pela leitura. Se elas costumam ver os pais lendo, acabarão percebendo que o livro é parte integrante da casa, e não só um objeto decorativo e supérfluo”, declara o estudante Romário Antônio de Alencar, hoje cursando o 2º ano do ensino médio no Colégio Modelo Luís Eduardo Magalhães, acrescentando que aprendeu a gostar de ler através das historinhas e dos livros infantis que a mãe lhe mostrava.

Com o intuito de aproximar a comunidade do ambiente escolar, a Secretaria de Educação de Juazeiro desenvolve, ainda em formato embrião, o Projeto Contos. “É uma proposta nova, na qual os professores comparam as diferentes linguagens empregadas na exposição de contos clássicos da literatura mundial. O programa é realizado em praças públicas e visa tornar o hábito da leitura presente e prazeroso, principalmente entre os jovens”, ressalta a secretária de educação do município, Walquíria Souza de Brito. Além disso, a repartição acertou uma parceria com a empresa de formação e capacitação de educadores Abaporu, no desígnio de aprimorar a técnica dos professores, o que, decerto, tenderá a gerar um progresso substantivo nesse aspecto.

Todavia, a situação ainda é pouco confortante. Para Maria Batista, professora e mãe de dois alunos do Centro Educacional Girassol, a escola deveria desempenhar a função de incentivadora, mas não tem feito da melhor maneira. “A escola não tem despertado o prazer da leitura, o livro paradidático ficou sendo um instrumento de avaliação e os professores passaram a cobrar resumos e fichas de leitura. Mesmo crianças que gostavam de ler na primeira infância perderam o prazer na escola, porque os alunos ficaram com a obrigação de responder questões superficiais sobre os livros”, comenta a instrutora.

Além do modo de ensino retrógrado usado pelas escolas, a diminuta influência familiar, a dificuldade no acesso a livros, revistas e jornais, outro fator tem contribuído para o desprezo frente ao hábito elevador e sadio da leitura: o ciberespaço. “Estamos atravessando a fase da ‘escola do espetáculo’, onde a palavra vem sendo substituída pela tríade imagem, som e movimento, perdendo espaço enquanto ferramenta de mediação comunicacional. Uma sociedade de espectadores viciados, hedonistas e consumistas está sendo gerada numa velocidade inimaginável. Por conseguinte, o tempo para o prazer está cada vez mais reduzido. Não tenho dúvidas que é esta ‘sociedade fast-food’ a causa maior da redução do número de leitores no mundo. E que para revertermos esse quadro será muito, mas muito difícil”, enuncia Edeil Reis.

5 comentários:

Germano Viana Xavier disse...

Crédito da imagem:

"Livros
by ~kadubx"
Deviantart

Hugo de Oliveira disse...

Infelizmente a escola pública não oferece espaços adequados, para o funcionamento de uma biblioteca ou sala de leitura, as poucas existentes geralmente funcionam de forma precária e sem profissionais com habilidades específicas para o desenvolvimento de projetos de leituras. Deste forma, fica cada vez mais difícil o acesso a literatura brasileira por parte de nossos alunos.
É urgente a necessidade da prática de leitura e conhecimento literário, primeiramente por parte dos profissionais da educação básica, especialmente os de educação infantil e séries inicias do ensino fundamental, pois são os profissionais que trabalham com a base educacional. Nossas crianças precisam de incentivo a partir da educação infantil.

abraços
de luz e paz

Hugo

PERSEVERÂNÇA disse...

Abraço fraternal e boa leitura!!!
Nicinha

vendedor de ilusão disse...

Olá, passei para lhe desejar um excelente final de semana! E lhe parabenizo pela postagem, - gostei muito!
Abraço.

Unknown disse...

Mal mal alguns dos milhares ditos alfabetizados só conseguem tomar um ônibus coletivo porque já conhecem os veículos pela cor das concessionárias ou interpretam o destino na bandeira como signos. Tudo isso porque acreditam piamente nas políticas públicas feitas também por semi-analfabetos.