domingo, 6 de maio de 2012

Newsmaking


 Por Germano Xavier

Os valores/notícia e o emprego dos critérios de noticiabilidade no ambiente jornalístico (com análise do periódico Diário da Região, da cidade de Juazeiro-BA). 

“Dois executivos de uma cadeia de televisão norte-americana assistiam a três telejornais ao mesmo tempo. Uma das notícias do dia relatava um incêndio num orfanato em Staten Island. Após o final da reportagem, um dos executivos lamentava-se porque uma televisão concorrente tinha melhores imagens na sua reportagem. ‘As chamas deles são mais altas que as nossas’. Mas o outro executivo respondeu: ‘Sim, mas a nossa freira chorava mais alto que as outras’”. (Diamond, 1976, p.11) 

Separar o joio do trigo, como quando se deseja o deleite por sobre os melhores grãos. Peneirar, deixando vazar apenas o mais fino da matéria. Cessar, no balanço do instrumento movido pelas mãos do operário, a nos remeter imagem de construção, de desenvolvimento e de progresso. Talvez esteja aqui definido, em sua total clareza, inteireza e simplicidade, a digna tarefa que o profissional da área do jornalismo deve realizar, seja em que modalidade de trabalho for (impresso, radiofônico, digital, entre outros). Selecionar o que é de essência/ou de essencial no conteúdo que se quer propagar. 

Todavia, o jornalismo, em sua antiga tentativa de legitimação, acabou criando diferentes formas de controle e geração de material noticioso. Segundo o teórico da comunicação Mauro Wolf, a noticiabilidade define-se “como o conjunto de elementos através dos quais o órgão informativo controla e gera a quantidade e o tipo de acontecimentos, de entre os quais há de selecionar as notícias”. E é nesse contexto em que estão inseridos os valores/notícia, aos quais o próprio Mauro os definiu “como um componente de noticiabilidade”. 

Indubitavelmente, caso não existissem tais critérios de análise do material de cunho jornalístico com prováveis chances de compor um espaço nos diferentes Media, todo o processo de “fabricação” da informação seria prejudicado, haja vista que um “caos construtivo” seria germinado no ambiente de trabalho, o que acabaria desotimizando todas as relações de produção, que vão do recolhimento e busca do fato propriamente dito até a chegada às mãos dos leitores/consumidores, passando pela lapidação e limpeza dos canais de difusão da mensagem, tornando mais nítida e eficaz a sua transmissão e entendimento do seu teor por parte dos receptores. 

Todo esse processo seria de uma simplicidade tamanha. Seria, caso houvesse a prática da liberdade de expressão por parte dos jornalistas. Entretanto, como João Canavilhas diz, “o processo informativo não é um sistema livre de influências externas aos atores informativos. A política, a economia e a religião são exemplos de fatores que podem influenciar o processo de produção noticiosa”. E, diante disso, perguntamo-nos: quais são os acontecimentos que podem ser considerados mais expressivos e relevantes, e que, por isso mesmo, possuem características que os fazem propícios para serem transformados em notícia? 

Eis que um dos exercícios mais dispendiosos da rotina de trabalho jornalístico, e que, por sua vez, necessita do máximo de cuidado e sensibilidade disponível... É preciso salientar que, cada um dos valores/notícia funciona em dependência dos outros critérios de noticiabilidade. Tudo está inteiramente relacionado, como numa engrenagem onde cada peça complementa a outra. Os valores/notícia são, portanto, segundo Mauro Wolf, “regras práticas que abrangem um corpus de conhecimentos profissionais que, implicitamente, e, muitas vezes, explicitamente, explicam e guiam os procedimentos operativos redatoriais... Os valores/notícia são qualidades dos acontecimentos, ou da sua construção jornalística, cuja presença ou cuja ausência os recomenda para serem incluídos num produto informativo. Quanto mais um acontecimento exibe essas qualidades, maiores suas possibilidades de ser incluído”. 

Algumas dessas qualidades podem ser traçadas aqui, de uma maneira breve, como por exemplo: o momento do acontecimento (quanto mais atual for o acontecimento, mais probabilidade de adentrar em um espaço noticioso. Em se tratando de televisão, o fato fica ainda mais evidente); a intensidade do acontecimento (aqui há uma análise da proporção que tomou o fato ou, ainda, a dimensão que ele pode tomar); a clareza (quanto menos dúvidas o acontecimento provocar, mais chances ele terá de ser incluído como material jornalístico; a proximidade (quanto mais próximo da população e do público a que o veículo jornalístico se destina, mais provável a inclusão); surpresa (aqui a questão ddo inesperado conta pontos a favor de sua projeção); continuidade (se o caso não sofrer uma sublimação e permanecer vigente sobre o restante das discussões, ele provavelmente terá maiores chances de se transformar em notícia; a composição (aqui aumenta-se a atenção para o fato do acontecimento conseguir dialogar com uma área ou temática diferente daquelas usuais e corriqueiras. Quanto mais diversificado o assunto, mais propício ele estará a ser incluído, já que existe uma necessidade muito grande no bom jornalismo, que é o de saber diversificar os temas abordados); valores socioculturais (quanto mais o tema mexer com os padrões culturais de uma dada comunidade, maior será a probabilidade de ser transformada em notícia); valor das imagens, previsibilidade e gastos de produção também são outros valores/notícia que valem ser conferidos. Outras qualidades específicas que fazem com que um acontecimento se encaixe em um aparelho noticioso, e que, posteriormente, podem alicerçar uma forte discussão com a sociedade por mera imposição do veículo são: o grau e nível hierárquico dos indivíduos envolvidos no acontecimento noticiável, o impacto sobre a nação e sobre o interesse nacional e o interesse frente à concorrência e ao mercado propagandístico. 

Na verdade, o principal objetivo do emprego dos valores/notícia é a tentativa de rotinizar a tarefa jornalística. Para que totó esse mecanismo funcione de forma rápida e adequada, é preciso que todas as peças estejam devidamente encaixadas, sem nenhuma folga ou anomalia. Tudo isso para que a utilização e a veiculação dos critérios de noticiabilidade, o que implica na aplicação dos valores/notícia, ocorram de maneira automática e instantânea. No entendo, é preciso deixar claro que essa aplicação não representa uma espécie de “cartilha” rígida e indefectível, tendo em vista que o emprego dessas características fundamentais são flexíveis e totalmente utilizáveis em todos os ambientes do jornalismo. 

Todavia, essa instantaneidade, no que diz respeito à escolha do material, não deve ser confundida com arbitrariedade e, tampouco, com objeções sem fundamentação. 

Com relação ao jornalismo praticado na região do Vale do São Francisco, e que é o principal objetivo desse texto, em princípio foi realizado uma entrevista com a repórter Ana Lima e o editor-chefe do periódico “Diário da Região” (jornal fundado em 23 de dezembro do ano de 1972 na cidade de Juazeiro-Bahia e que circula nesta cidade e em suas proximidades), Antônio Pedro. Posteriormente, foi feita uma análise crítica de dois exemplares do jornal (22/24 de julho de 2006 e 29/31 de julho de 2006). 

Num olhar de esguelha, constata-se uma deficiência no embasamento teórico dos profissionais que produzem o noticiário, o que dificulta o recolhimento de informações mais precisas para o fomento desse trabalho. Percebe-se a predominância de matérias de cunho político (partidarismo), inclusive nas propagandas. Há, também, o gosto pela espetacularização dos acontecimentos, que pode ser identificado desde a escolha das manchetes até o corpo das notícias. As fotos também ajudam a manter essa característica que, creio, não é positiva. Aqui, os valores/notícia (critérios de noticiabilidade) mais utilizados /visíveis foram: o momento do acontecimento, a proximidade, surpresa, valor das imagens, o grau e o nível hierárquico dos indivíduos envolvidos no acontecimento noticiável e o interesse frente à concorrência e ao mercado propagandístico. 

Os critérios de noticiabilidade permitem distinguir o que é notícia do que é apenas acontecimento. E, como diria Tuchman, “selecionar implica reconhecer que um caso é um acontecimento e não uma casual sucessão de fatos”, o que também inquieta àqueles que leem o jornal e que possuem um olhar mais acurado sobre os procedimentos usados pelo periódico. Fica a esperança de que um dia haja, em todos os ambientes em que a notícia é a matéria-prima, a capacitação necessária para o bom desempenho do jornalista enquanto responsável pela informação diária de inúmeras pessoas. Assim, dessa maneira, continuemos... 

Referência Básica 

WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. Lisboa: Presença, 1987.

2 comentários:

Germano Viana Xavier disse...

Crédito da imagem:

"Jornalby ~joapa"
Deviantart

Ida disse...

This is gorgeous!