segunda-feira, 9 de maio de 2011

Meus crônicos vinte e poucos anos


Por Germano Xavier

Nasci numa pequena cidade baiana, nordeste brasileiro, mais precisamente sob os auspícios dos morros selvagens da imponente Chapada Diamantina, Iraquara, fui criança, joguei bola na rua, travinhas feitas com nossos chinelos surrados, topei o dedo várias vezes, andei e caí de bicicleta, bola de gude, soltei pipa, pulei muro, puxei carrinho pela rua, caminhei descalço, resfriado, bicho-de-porco, unha roxa, unha que caiu, pingue-pongue, casa dos bancários, joguei Game-Boy, Tatiane, rua Tito Luna Freire, “taco-no-chão”, água de mangueira, beca de matar lagartixa, espingarda de chumbinho, cachorros, caretas, bolo-na-mão, elásticos, bola na grama, mistério, rua de baixo e rua de cima, morcego, vadiações, futebol, brincadeira, parque de diversões, novidade, espírito desbravador, meu pai que troca de carro, carro grande agora, todos os meus tios pernambucanos e carecas, inocência, meninas, joelhos de meninas, tornozelos, meu irmão maior Gustavo, réveillon, teclado, revista Quatro Rodas, leitura na cama, velas acesas, número 17, signo de câncer, solidão, primeiros versos, carnaval em Palmeiras, banhos no Mucugezinho, doce de leite no posto de gasolina, Itaberaba, casa que nunca existiu, estudo que não também, desencontros, picanha de Itaberaba, minha mãe que discute, notas altas, menino calado, aula de português, primeiro esboço passional, colegas eternos, Abelardo, Tatiane, Hortência, Ykatierina, desencontro, desespero, reza, minha mãe, presentes do meu padrinho Tibiro, uniforme escolar, cantina, salgadinho de bacon, desilusões, futebol de bola de meia, pênalti perdido nas Olimpíadas Estudantis, CDF, praça da igreja, talvez o amor, brigas, retornos, van, escola, festinhas, minhas primas e meus primos, vídeo-game, Lucas, Kung Fu, Karatê, formaturas, poesia, gincanas, medalhas, desfiles de 7 de setembro, concurso da bicicleta mais enfeitada, desilusões, passeios, Carminha, tempos áureos, Educandário José de Arimatéia, aluno nota 10, menino muito calado, professor Édson que fez uma arraia gigante para mim, N2002, Qchute ou Kchute, primeira aula de física na 8ª série com a professora Ana Emília, aluno nota 10, medalhas e troféus, menino calado e aluno nota 10, a sala de aula vazia no intervalo, só um menino só, prova, diversão, meninas, um rapaz calado, muito calado o rapaz, vergonha, poesia, primeiros passos, "A poesia é a insânia¹", vergonha, pele branca, vergonha de ser branco demais, Meu pé de laranja lima, Os cavaleiros do zodíaco, voz começa a engrossar, febre dos salgadinhos da Elma Chips, muito picolé antes de ir estudar, também muito mel num pires, silêncio, mais poesia, mais solidão, reggae, cursos, vestibular, loucuras, rua vazia, poesia, aluno nota 9, poesia, poesia, poesia, ladeiras, suor, calor, idas e vindas, livros, livros, livros, livros, sexo, poesia, aluno que se transforma em professor, responsabilidades, reconhecimento, meninas, cabeça cansada, cansaço, jornalismo, tempo que passa, vozes elevadas, sofrimento, lágrimas, desilusão, tristeza, casa de amiga, vontade de pular do Morro do Pai Inácio, a morte, a vida, vontade de viver, vontade de dar a volta por cima, ou por baixo mesmo, remédios para dormir, injeções, comprimidos contra uma possível loucura, solidão, aula de redação, poesia, biblioteca, poesia, revolta, solidão, poesia, vergonha, solidão, menino calado, esquisito rapaz misterioso, garoto anti-social, poesia, poesia, poesia, palavras, palavras, solidão, poesia, menino calado... e tantas outras coisinhas que vivi em Iraquara, tantas outras, tantas...


Notas.
1 – Aforismo de Sêneca, pensador grego.

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